Reproduzo texto de Anderson Barbosa do Novo Jornal:
Se já foi surpreendente o fato de o NOVO JORNAL ter intermediado junto ao traficante João Maria da Silva a libertação de 54 mulheres que passaram 24 horas dentro da penitenciária de Alcaçuz – com toda a comunicação sendo feita através de um aparelho celular que o preso mantinha dentro de sua cela – alguns números que a reportagem descobriu na tarde de ontem são ainda mais absurdos. Somente este ano, em vistorias realizadas nas três maiores unidades prisionais do Rio Grande do Norte, já foram encontrados 1.012 telefones em poder dos presos. A maioria, exatos 886 celulares, só em Alcaçuz.
Considerando que Alcaçuz possui hoje mais de 600 internos, seria o mesmo que distribuir um celular e meio por apenado. Na Penitenciária Estadual de Parnamirim (PEP) foram encontrados 90 aparelhos e na Penitenciária de Mossoró mais 36. “Eu estaria mentindo se dissesse que não há corrupção dentro das penitenciárias. Infelizmente acontece, mas estamos trabalhando para coibir a entrada de celulares nas penitenciárias”, afirmou o coordenador do sistema prisional do Rio Grande do Norte.
Já o secretário Thiago Cortez, titular da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc), afirmou que medidas administrativas já foram tomadas para descobrir como os telefones estão entrando nos presídios com tanta facilidade. “O Ministério Público e a corregedoria já estão apurando as denúncias de que agentes e policiais estão por trás destes crimes”, revelou.
A preocupação do secretário tem muito fundamento. Na edição de ontem, que revela a conversa que a reportagem teve com o preso João Maria, ele, que disse inclusive pertencer à maior facção criminosa do país, o PCC, afirmou que visitantes não entram com parelhos celulares em cadeia nenhuma. “Você sabe que visita não entra com celular. Quem entra com telefone são os agentes. É só pagar que você recebe”. Em outro trecho da conversa entre o preso e o repórter, João revelou inclusive o valor que se paga para conseguir um telefone em Alcaçuz: “Sou burro não. Se disser o nome deles (dos agentes) eu morro. O telefone custa R$ 1 mil”.
Se as informações do traficante são verdadeiras, a conta fica fácil de fazer. Como cada aparelho custa R$ 1 mil, a movimentação financeira dentro das unidades prisionais do estado já ultrapassa a cifra de R$ 1 milhão.
“Estamos tentando recuperar os detectores de metal que estão inutilizados. Isso vai ajudar”, limitou-se a afirmar Thiago Cortez, questionado sobre a aparelhagem que a Sejuc possui para coibir a entrada de aparelhos celulares. O problema, é que os agentes penitenciários não passam pelas revistas. “Aí cabe a polícia investigar. Se ficar comprovado que os agentes estão facilitando, devem ser punidos exemplarmente”, concluiu o secretário.
Aparelho rastreador já havia detectado, em maio, mais de 500 celulares dentro de Alcaçuz
O tráfico de drogas no Rio Grande do Norte está fortemente ligado à Penitenciária Estadual de Alcaçuz. Tanto que, se alguém quiser se tornar um grande traficante, basta ter intimidade com algum bandido preso lá dentro. Somente assim, através da credibilidade e da confiança que estes criminosos têm com as grandes facções do Rio de Janeiro e São Paulo, principalmente, é que as drogas serão enviadas para cá.
Maconha, crack, cocaína, tanto faz. Mas, afinal, os presos de Alcaçuz possuem contato com os narcotraficantes de fora? “Sim, claro que sim”, já havia afirmado o delegado Odilon Teodósio, titular da Delegacia Especializada em Narcóticos (Denarc), em matéria publicada pelo NOVO JORNAL em maio deste ano.
Na época, o delegado chegou a revelar que um equipamento rastreador de ligações havia sido testado nas proximidades de Alcaçuz. O objetivo foi comprovar que os presos estavam utilizando equipamentos de comunicação no interior das celas. E como estavam!
“Mais de 500 números diferentes de telefone celular foram captados pela máquina, trazida de Brasília somente para esta finalidade”, confirmou Odilon.
Durante a entrevista, o titular da Denarc abriu o jogo e escancarou o esquema. Denunciou a falta de segurança na penitenciária e alertou: “O presídio é frágil. O problema da droga no Rio Grande do Norte chama-se Alcaçuz. É a principal porta de entrada de entorpecentes. Os presos de Alcaçuz têm muito contato com as grandes facções criminosas do país, principalmente com o PCC e o Comando Vermelho. Como sempre pagam pelas encomendas, conquistaram muita credibilidade e influência. Para alguém ser um comerciante de drogas de respeito aqui, primeiro tem que conhecer os traficantes presos em Alcaçuz. Eles fazem a ponte. São os verdadeiros intermediários do negócio”, disse Odilon.
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