Jair Bolsonaro (centro) a Mario Abdo Benítez (esq.) sobre as esquerdas: ‘Tudo quando eles perdem, eles dizem que é golpe’ – (Alan Santos/Flickr)
Sem perceber que os microfones de tradução simultânea da Cúpula do Mercosul, realizada em Bento Gonçalves (RS), seguiam ligados, Jair Bolsonaro fez uma brincadeira ao passar a presidência do bloco econômico ao líder do Paraguai, Mario Abdo Benítez.
Presidente do Mercosul até esta quinta-feira (5), Bolsonaro entregou a Abdo Benítez o martelo que simboliza a troca de comando do grupo sul-americano. Segundo a tradição, quando a presidência temporária passa de um país para outro, o novo líder martela um pedaço de madeira.
Após o paraguaio cumprir o gesto, Bolsonaro brincou: “Quero continuar presidente, não dá pra dar um golpe, não? Tudo quando eles perdem dizem que é golpe. É impressionante, né?”. Abdo Benítez riu.
Há menos de um mês, Evo Morales renunciou à Presidência da Bolívia pressionado por manifestações populares e pelas Forças Armadas. A sugestão do comando militar para que deixasse o poder foi chamada de golpe de Estado pelo líder indígena.
Evo classificou da mesma forma a autoproclamação de Jeanine Añez como presidente interina do país, uma vez que a senadora assumiu o cargo a partir de uma interpretação controversa da Constituição e do regimento do Senado boliviano.
Na abertura do encontro presidencial da Cúpula do Mercosul, Bolsonaro e o atual mandatário argentino, Mauricio Macri, mandaram recados ao centro-esquerdista Alberto Fernández, eleito presidente em outubro. A cerimônia de posse está marcada para a próxima terça-feira (10).
Bolsonaro disse que o bloco “não pode perder tempo, nem podemos aceitar retrocessos ideológicos” e enfatizou a necessidade de enxugar ainda mais a estrutura do Mercosul e de reduzir a TEC (tarifa externa comum).
Macri reforçou a mensagem. Indicou que os avanços de seu período à frente da Argentina, durante o qual foram assinados acordos com a União Europeia e com a EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio, na sigla em inglês), deveriam continuar.
Fernández tem críticas e quer revisar ambos os pactos. “Não se deve abandonar o que avançamos no Mercosul”, afirmou Macri.
Já Abdo Benítez, a quem Bolsonaro chamou de “meu irmão paraguaio”, agradeceu o brasileiro por seu “apoio quando houve uma ameaça à nossa democracia”, referindo-se ao processo de impeachment contra ele, em agosto. O Planalto atuou para arrefecer o processo, como acabou acontecendo.
Os líderes do Mercosul também discutiram a crise na Bolívia. A voz dissonante veio do Uruguai, por meio da vice-presidente Lucía Topolansky, que definiu a crise no país andino como “um rompimento institucional”.
“Não podemos atuar como se o Mercosul fosse um paraíso. Não é. Estamos num contexto regional preocupante, em que vários países estão vivendo conflitos institucionais, com violações dos direitos humanos e perda de vidas”, disse.
Macri, por outro lado, disse que valorizava o papel da senadora Jeanine Añez que, “como presidente interina, está buscando a paz democrática em seu país, adotando um caminho constitucional, liderado pelo Congresso”.
Em paralelo às manifestações e crises no continente, Topolansky, assim como havia feito o chanceler uruguaio, Rodolfo Nin Novoa, no dia anterior, chamou a atenção para a maturidade da democracia uruguaia.
“Ganhou quem nos fazia oposição. Mas, na próxima reunião, quem estará aqui será um uruguaio, porque em meu país, uruguaios somos todos, e o Uruguai é um só.”
Folha de São Paulo
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