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Enquanto Netflix encomenda, nós temos estúdio, diz diretor da Globo sobre séries

No dia 4 de maio, a Globo abre nova fase. A primeira temporada de “Brasil a Bordo”, de Miguel Falabella, será disponibilizada por inteiro no Globo Play, seu serviço de vídeo por demanda, que cobra R$ 14,20 por mês. Na TV Globo, o espectador só poderá ver em janeiro de 2018.

Em junho próximo, outra série, “Carcereiros”, chega ao Globo Play –e a TV aberta só vai exibir no ano que vem.

“A gente sempre fala de ‘Justiça’, uma série extraordinária”, diz Amauri Soares, 50, diretor de programação. “Se você é jovem, trabalha e faz faculdade, eu não te alcançava [com ela] na TV aberta. Mas te alcanço por Globo Play.”

Soares falou à Folha no prédio central da emissora, no Jardim Botânico, no Rio, em conversa da qual também participaram Erick Brêtas, diretor de Mídias Digitais, e Ricardo Waddington, diretor de Gênero e Multitelas.

Foto: Leo Pinheiro/Valor/Folhapress

Folha – Não existe mais prioridade para a TV aberta?

Amauri Soares – O jogo é de janelas. É a nossa realidade, é o que a tecnologia acabou proporcionando: janelas digitais convivendo com janelas de massa como a TV aberta. Hoje essa integração é a grande oportunidade dos conteúdos. Você alcança mais gente, ao longo de um ciclo maior. A gente sempre fala de “Justiça”, uma série extraordinária no ano passado. Mas se você é jovem, mora em São Paulo, trabalha e faz faculdade, eu não te alcançava na TV aberta. Você está no ônibus na hora em que estou exibindo. Mas eu te alcanço por Globo Play.

Netflix e Amazon se concentraram em séries. A Globo faz séries, mas a marca é novela.

Como programador, o desafio é o formato mais adequado para cada plataforma. Um formato de 180 capítulos tem questões a serem resolvidas em VOD [vídeo por demanda], por exemplo, de narrativa. É para ser acompanhado diariamente, ao longo de tempo maior. Ele é eventizado, gera comentários, municia você de assuntos. Não imaginamos uma pessoa fazendo “binge watching” de 180 capítulos. [risos] Já a série tem adequação enorme para “binge”. É um dos atributos do Globo Play, assistir tudo de uma vez, na hora que quiser. E a Globo é produtora de séries há muito tempo, desde quando não era moda, desde os anos 1960, “Delegacia de Mulheres”.

“Justiça”, “SuperMax”, quais foram as que funcionaram até agora, neste período de teste?
Aí a gente está falando de séries exibidas também na TV aberta. Foi uma primeira experiência. A gente está indo agora para outra, em que o Globo Play terá séries que não estão sendo exibidas na TV aberta. É outra dinâmica. Até aqui, estamos felizes, porque os conteúdos desempenharam muito bem no Globo Play, foram mobilizadores no digital e TV aberta. Teve um ganha-ganha. “Justiça” foi produto de audiência excepcional na TV aberta e na Globo Play.

A TV paga passa por uma dissolução dos pacotes. Até que ponto ela tem futuro?

A gente sempre cai na armadilha de que algo vai substituir. Não substitui: complementa. Talvez não faça mesmo sentido você assinar um pacote de canais de filme se tem um serviço de VOD de filmes tão eficiente, mas um canal de esporte, de jornalismo, faz sentido. A TV paga tem o lugar dela. O canal segmentado, o campeonato espanhol ao vivo, a GloboNews, é serviço que tem importância e vai continuar. O VOD para filme é realmente um serviço extraordinário, mas é bom a gente lembrar que a TV paga é maior que canal de filme. A TV paga entrega canal de humor, de show, canal infantil. A oferta vai ficando mais sofisticada. Bom para o consumidor.

Não existe agora o risco, para a Globo, de apostar em muita coisa ao mesmo tempo?

Este grupo de comunicação aqui começou como jornal. Depois viu oportunidade no rádio, na televisão, na TV paga. Tem essa ideia de grupo. A Netflix é focada, mas ela é focada até nascer a disruptiva dela. [risos] Vamos ver o que a Netflix fará, quando aparecer a Netflix da Netflix. Vamos ver se não vai ter também de se desdobrar. O que eu vejo [na Globo] é uma coerência de se posicionar como criador de conteúdos, seja para que plataforma for. Esse posicionamento é muito claro, do grupo. Criamos conteúdos de qualidade, buscando determinadas características de relevância, de brasilidade.

Como é o seu hábito de consumo de vídeo e TV?

Eu vejo tudo da Globo. Vejo outras TVs abertas, no Brasil. E gosto de ver o que está sendo feito fora do Brasil. Vi todas essas séries. Gostava muito de “The Walking Dead”, mas me decepcionei. No começo desta temporada, abandonei. Vejo muita coisa. E tenho um filho de 15 anos que me faz ver outras, mais próximas da idade dele. Leva você para outro conteúdo. Ontem mesmo eu vi um game novo no iTunes, um game sensorial, incrível.

Ted Sarandos, de função equivalente à sua na Netflix, foi quem falou: “A gente põe tudo de uma vez e vê o que acontece”. Aí nasceu o “binge”.

Eu não acredito tanto em “insight”, 100% empírico, “vamos ver o que acontece”. Eles têm um conhecimento acumulado, de consumo de audiovisual, desde o tempo do filme por correio. Tem uma base de dados enorme e uma capacidade enorme de analisá-lo. Mas eu acho que aqui [na Globo] a gente tem uma oportunidade ainda mais rica. Uma plataforma como a Netflix encomenda fora seus conteúdos. Aqui nós temos um estúdio, a gente trabalha junto. É extraordinário poder ter essa relação, eu como programador com meus colegas criadores, poder cruzar soluções artísticas que eles encontram com a busca de adequação, de desempenho do nosso lado, de forma cada vez mais analítica.

Folha de São Paulo

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