O Ministério Público Estadual protocolou na manhã de hoje (09/12) um total de 16 denúncias contra 97 integrantes de organizações criminosas que atuam dentro e fora dos presídios do Rio Grande do Norte. De acordo com as investigações os presos se associaram para cometer crimes como tráfico ilícito de entorpecentes e assaltos. Outras denúncias ainda serão oferecidas, dentro do prazo legal.
As denúncias lembram em sua parte introdutória que a existência de organizações criminosas dentro do sistema penitenciário estadual já era mencionada desde o ano de 2003, quando diversas fontes relataram a existência de uma organização com atuação na Penitenciária João Chaves chamada de “Primeiro Comando de Natal (PCN)”.
As investigações atuais se aprofundaram com as provas obtidas por diversos meios, inclusive apreensões de documentos nas unidades prisionais, e indicam concretamente que os integrantes das organizações criminosas que atuam no Estado planejam e comandam crimes a partir dos presídios, compartilhando expertises, além de buscarem construir dois tipos de monopólio.
O primeiro é o monopólio de oportunidades no sistema carcerário, que diz respeito às oportunidades de comércio informal/ilegal que vicejam no universo carcerário, dando por meio da força, prioridade ou exclusividade aos que integram a organização criminosa. O segundo é o monopólio do poder político, com obediência não necessariamente consentida, às normas e às formas de conduta instituídas pela organização, assim como a definição de transgressão, acusação dos transgressores e a correspondente punição.
Essas hegemonias visam criar uma estrutura paralela ao Estado, ocupando o vácuo da débil ação estatal da porta para dentro do sistema e permitem uma expansão de poder dos grupos para além das prisões, gerando o controle de territórios, os quais são essenciais para o controle do comércio extremamente lucrativo das drogas ilícitas, eliminando aqueles que se opõe a este poder.
A relação entre o tráfico de drogas e os roubos se expressa na investigação, quando o tráfico é a atividade que arrecada receita corrente e os assaltos constituem espécie de receita de capital, uma atividade financiando a outra, intensificando-se assaltos por exemplo quando há grandes apreensões e, portanto, prejuízos à fonte de receita corrente.
Foi identificada a conta bancária de uma das facções, que teve sigilo quebrado por ordem judicial, da qual se observa expressiva movimentação, inclusive, vários créditos de R$ 400,00 referentes a contribuição mensal dos associados, apelidada de “cebola”.
No transcorrer da investigação ficou evidente a formação de diversas células com autonomia para diversos tipos de ação, embora o poder de decisão final sobre assuntos sensíveis às organizações criminosas ainda esteja concentrado em algumas lideranças.
Para que as lideranças de uma das organizações criminosas não percam o contato e o controle sobre as células que a compõem, foram criadas em uma das organizações as denominadas “sintonias”, dentre as quais merecem destaque:
a) a “Sintonia Geral do Estado”, responsável pela expansão e difusão da ideologia e métodos de outros Estados da Federação;
b) a “Sintonia Geral do Sistema”, responsável pelo controle e coordenação dos membros presos, pela resolução de conflitos dentro dos estabelecimentos prisionais e pela coordenação do tráfico de drogas dentro do sistema prisional, engloba, também, a “Sintonia do Salve”, responsável por difundir entre os presos os “salves” ordens e mensagens emanados pelas sintonias superiores;
c) a “Sintonia Geral da Rua ou Disciplina”, responsável pelo controle e coordenação dos membros que estão em liberdade e das ações executadas fora do sistema prisional;
d) a “Sintonia Geral dos Gravatas”, responsável pela interação e contatos com os advogados que prestam serviços regulares na defesa dos integrantes;
e) a “Sintonia Geral do Bicho Papão ou do Progresso”, responsável pelo gerenciamento do tráfico de drogas dentro e fora dos presídios, bem como por ações importantes ao fortalecimento da facção (fugas, grandes assaltos etc);
f) a “Sintonia Geral da Rifa”, responsável por coordenar a realização de rifas periódicas e obter prêmios, visando a fortalecer o “caixa” da facção. O sorteio é baseado na Loteria Federal e os integrantes da organização criminosa são obrigados a comprar e vender a rifa, tendo ciência dessa obrigação por ocasião do batismo;
g) a “Sintonia Geral do Livro ou do Cadastro”, responsável pelo registro dos “batismos” de novos membros, das exclusões de membros que incorreram em falta e dos “retornos” de membros que se reabilitaram.
As provas coletadas no decorrer da investigação identificam os detentos que cumprem essas funções e revelam toda a estrutura das organizações criminosas investigadas, sendo estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, havendo similitude de métodos, semântica, rituais e princípios nas duas organizações atualmente operantes no Rio Grande do Norte.
MPRN
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