Em disputa interna com o senador Aécio Neves (MG) para se cacifar como candidato do PSDB na eleição para a Presidência em 2018, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, tem aproveitado a falta de diálogo entre movimentos sociais e a presidente Dilma Rousseff para se aproximar de grupos ligados à esquerda e ao PT.
Um dos principais alvos desde o mandato anterior do tucano, iniciado em 2011, tem sido o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), histórico aliado dos petistas.
A aproximação, intensificada nos últimos anos e criticada por ruralistas, terá nesta quinta-feira (14) um marco: a sanção da lei estadual que permite a transmissão de terras a herdeiros de assentamentos rurais e o acesso deles a meios de financiamento.
“É uma sinalização de um governo que enxerga o conjunto do espectro da sociedade e não se limita a um único segmento”, disse à Folha o secretário da Casa Civil, Edson Aparecido, insistindo em uma marca buscada por Alckmin.
Um evento na residência oficial do governador reunirá Alckmin e os sem-terra para celebrar a lei, que sai do papel pela primeira vez no Brasil no Estado de São Paulo.
“É surpreendente e bom que esse projeto venha de um governo tucano. Isso ajuda a pressionar a esquerda e o governo”, elogia Gilmar Mauro, dirigente do MST.
Além de elaborar e propor a lei para Assembleia paulista, o governador deu sinais claros do namoro com os sem-terra em 2015. Cedeu um espaço nobre da capital, o Parque da Água Branca, para a sediar a primeira Feira da Reforma Agrária do MST.
O gesto incomodou petistas, que compareceram em peso ao evento para reforçar o elo com o grupo. Até o ex-presidente Lula confirmou presença de última hora e afirmou, em conversa com dirigentes do movimento, que o governo federal tem que “correr para cumprir o compromisso que assumimos em praça pública com o povo que trabalha no campo”.
Dilma estabeleceu a meta de assentar 120 mil famílias em seu segundo mandato. A projeção do Ministério do Desenvolvimento Agrário para 2015 era a de assentar 32 mil famílias. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) fecha o balanço do ano em fevereiro, mas, nos bastidores, integrantes do governo admitem que a meta não será alcançada.
“Já estamos terminando o primeiro ano e me parece que foram assentadas 12 mil famílias até agora”, disse Lula em vídeo gravado para o movimento no fim de outubro.
AGENDA CONJUNTA
As iniciativas do governo tucano integram uma agenda criada em conjunto com o MST em 2013. Depois de uma reunião com Aparecido e Gilmar Mauro, o governador convocou, em 2014, seus 27 secretários para um encontro com uma comissão do MST.
De lá saiu uma lista de projetos que inclui a construção de moradias populares no campo, concessão de terras devolutas a assentados rurais e a construção de uma escola técnica de agroindústria em Itapira, no norte do Estado.
Desde então, Mauro tem encontros mensais com o chefe da Casa Civil de Alckmin para discutir o andamento das políticas pró-assentados.
Com a aproximação com o MST, as invasões de terras no Estado caíram de 58 em 2011, para 27 em 2015. “É consequência das nossas políticas envolvendo de produção à qualidade de vida”, diz Marco Pilla, da Fundação Itesp, responsável pelas questões agrárias de São Paulo.
Segundo ele, o relacionamento também teve efeito nas urnas. “Em regiões de assentamentos, como o Pontal do Paranapanema, onde o PSDB sempre perdeu, passou a ganhar. Na eleição de 2014, o mapa eleitoral ficou azul [referência à cor do partido].”
Gilmar Mauro confirma que o tucano tem conquistado votos. “Com certeza muito sem-terra votou no Alckmin. Temos a linha de votar em setores progressistas, mas mantemos a independência.”
O dirigente, porém, evita comparações com o PT, mas deixa seu recado: “Diálogo não é só conversa, é ação também. Isso que buscamos”.
REAÇÃO
Presidente da Sociedade Rural Brasileira, Gustavo Junqueira, com trânsito no governo paulista, classifica como “erro” a aproximação de Alckmin com os sem-terra.
“O governador não está explicando para as classes produtiva e urbana as motivações dessas políticas. Ou é só compra de voto?”, questiona, defendendo que a questão agrária seja vista pela perspectiva econômica.
Comparando o MST ao ETA, grupo separatista radical basco, e às Farc, da Colômbia, Junqueira afirma que o “oportunismo” do tucano abre margem para perda de apoio da classe produtiva. “No fundo, damos palanque a esse movimento terrorista, que é parte importante da base do governo federal.”
O ex-governador de São Paulo e vice-presidente do PSDB Alberto Goldman concorda que as políticas de Alckmin voltadas para o MST visam a eleição de 2018. “O objetivo de Geraldo é se apresentar como uma figura que pode trazer paz para o país, com uma política mais consensual e com capacidade de negociação”, afirmou.
Para ele, o tucano não corre risco de perder apoio de sua base eleitoral, já que a outra alternativa que se apresenta é o PT, que não tem afinidade com o segmento dos proprietários rurais.
Folha Press
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