Natal é a capital brasileira cujo percentual da indústria turística sobre o Produto Interno Bruto é o maior do país (4,4%), número acima da média nacional (3,6%). Por isso, com a chegada do período de férias, auge do verão, comerciantes que atuam nas praias urbanas ficam esperançosos quanto a elevação de lucros. Manter preços e qualidade dos serviços compatíveis com os apresentados durante o restante do ano, entretanto, tem sido uma das pedras no sapato para quem gosta de tomar uma cerveja e comer ginga com tapioca diante do Oceano Atlântico.
Em Ponta Negra, a guerra de preços começa ainda na avenida Engenheiro Roberto Freire. Visíveis para quem trafega no logradouro, camionetes abastecidas com cocos verdes adotam a metade do preço cobrado nas barracas à beira-mar. De um quiosque localizado nas imediações da entrada no conjunto, surge a quantia de R$ 1,50 por um fruto. O proprietário Carlos Cleber de Oliveira explica o processo. “Eles [vendedores da praia] compram da gente. Aqui nos temos carro para livrarmos o frete e os tiradores de coco, coisas que eles não têm. Nossa estrutura facilita na hora de determinar o preço”.
Carlos Cleber reclama do verão vigente. Para ele, “tá pior que baixa estação. O normal, numa época dessas, era eu vender uns 1,2 mil cocos por dia. Agora não chega a 400″. A menos de 1 km dali, no quiosque João Muniz, na avenida Erivan França, dois turistas conversam com o proprietário. Sem intenção de falar à reportagem, ele brinca ao pedir dinheiro para tecer palavras acerca da diferença de valores cobrados pelo mesmo produto. “Aqui é R$ 3 porque eu não tenho como pegar o coco da fonte. Já pago de um atravessador”.
No lado oposto da recusa de fornecer respostas, Almir Edson Rodrigues, há 21 anos em Ponta Negra, fala da crise do coco. “Está faltando. Antes era fácil e bem mais barato, mas agora eu pago R$ 1,50, para vender a R$ 2,50″. Sem chuvas no interior, a safra diminuiu e sufocou quem precisa abastecer o freezer todos os dias. A seu lado, Vanessa da Silva, de 22 anos de idade, vende óculos expostos em uma tela de arame. É seu primeiro verão nas areias de Ponta Negra – ainda que familiares trabalhem na praia.
Com preços que variam entre R$ 10 e R$ 20, ela tem sentido os efeitos da falta de divulgação do destino Natal e da situação precária pela qual passa a orla urbana. “Eu vinha com meu irmão todo ano. Tinha muito mais gente do que hoje. Tô aqui desde cedo e não vendi nada. E olhe que baixamos o preço. Num dia bom, vendo perto de dez pares”. Crise econômica no lugar mais procurado por turistas que, mesmo com o calçadão destruído, ruas esburacadas e cheias de lixo, transformam Natal em um dos recantos nacionais de maior interesse para habitantes de outras regiões.
Caso da paulistana Daniele Marques. Em sua segunda viagem ao Nordeste, ela demonstra encantamento com a paisagem natural e acredita na melhoria da limpeza, em relação ao verão passado. “Dá para notar que está mais limpo este ano. Em 2012, tinha uma sujeirada que não dava para acreditar. Falei até para amigos sobre a falta de cuidado com um lugar tão bonito”. Com as mãos ocupadas por duas latinhas de cervejas, que custaram R$2,50 cada, o custo da cidade é aceitável, segundo a enfermeira. “Até que não está caro aqui na praia. Alto é o preço nos restaurantes lá em cima [na pista]“.
Perto do Morro do Careca, Maria José Paula da Silva e José do Coco dividem poucos metros quadrados para posicionar dois carrinhos de comida. Ela vende ginga com tapioca, espetinhos de carne, frango e camarão, além de bebidas diversas. Ele é um nativo de 48 anos que esqueceu a idade exata de sua primeira incursão na praia. “Eu vendo a água mais pura do Morro”, diz um alegre João. “O inverno foi fraco, por isso a produção de côco também. Ano passado, comprei de R$ 0,70. Agora tá de R$ 1,20 e ainda assim, tem pouco. Não tem como não repassar esse aumento para o cliente”.
Já dona Maria José, moradora da Vila de Ponta Negra, onde divide uma casa de três quartos com marido e três filhos, o absurdo surge na concorrência, para ela, desleal empreendida por ambulantes oriundos de outras praias. “O povo vem da praia do Meio para vender mais barato aqui. Só que lá o cliente tem outro padrão, né? Então todo mundo aqui fica na bronca e os turistas desconfiam e perguntam por que com eles é mais barato”.
Sem noção da desavença entre pequenos comerciantes que ocupam as areias como base militares em tempos de guerra, o paulistano Paulo Ceraso, administrador de empresas que conheceu a Cidade do Sol em 1993 e voltou 20 anos depois com o filho adolescente e a esposa. Animado com os passeios que fará à Pipa e ao Litoral Norte, ele fala em paraíso tropical, em segurança maior que a megalópole onde vive e na hospitalidade do natalense.
Jornal de Hoje
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