A Polícia Federal acusa homens de confiança dos prováveis presidentes do Senado e da Câmara de receber propina e traficar influência em benefício de um empreiteiro
Distinto público: abrem-se nesta semana as cortinas para o mais um espetáculos políticos deste ano. A partir da sexta-feira, os parlamentares escolherão os presidentes do Legislativo. O voto deles é livre e secreto. Ao que tudo indica, duas estrelas da política subirão ao palco sob unânime aplauso. Na Câmara, será eleito presidente o deputado Henrique Eduardo Alves, do PMDB do Rio Grande do Norte, que há 42 anos engrandece o Parlamento brasileiro. No Senado, após cinco anos de ensaios forçados na coxia, voltará à presidência da Casa Renan Calheiros, também do PMDB, este por Alagoas. Henrique e Renan – ou Renan e Henrique, conforme pareça melhor à plateia – têm o mesmo estilo de atuação: gestos contidos, expressão ladina e repertório riquíssimo. Nos cofres da Polícia Federal, onde se encontram vários registros do trabalho dos dois, existe uma pequena e inédita obra-prima, estrelada por ambos, mas que ficara esquecida por não tão misteriosas razões. Trechos dela também podem ser encontrados no Superior Tribunal de Justiça. Trata-se da íntegra da Operação Navalha, que, em 2007, revelou ao país a existência de um esquema comandado pelo empreiteiro Zuleido Veras, da construtora Gautama, que pagava propina a políticos e burocratas em troca de contratos com ministérios de Brasília e governos estaduais. Apenas uma minúscula fração da enorme quantidade de provas produzidas pela PF veio a público naquele momento. Na papelada, há evidências fortes de pagamentos de propina para Renan e Henrique. Ou Henrique e Renan.
As provas constituem-se de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, relatórios de vigilância dos assessores de Renan e Henrique Alves, recibos bancários, anotações em agenda – e até uma contabilidade de caixa dois, preparada pelo tesoureiro de Zuleido. Entre a miríade de episódios de corrupção, conta-se aqui o que envolveu a construção da barragem Duas Bocas/Santa Luzia, no Rio Pratagy, em Alagoas, para ampliar o abastecimento da região metropolitana de Maceió. A busca de Zuleido para liberar dinheiro para a obra mobilizou tanto Renan quanto assessores de Henrique Alves. Era uma obra de R$ 77 milhões que, depois de receber R$ 30 milhões, está parada. Nada mudou. Assim como nada mudou em Brasília, onde os personagens envolvidos nesse desvio continuam em seus cargos. E, agora, subirão a seu derradeiro e consagrador ato final.
Cópias de recibos de pagamentos da Gautama para Francisco Bruzzi, assessor do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB). Bruzzi recebeu R$ 50.000 em três depósitos feitos pela Gautama.
Procurado Bruzzi disse não se lembrar a que se referem os depósitos. “Não sei do que se trata.” Bruzzi afirmou que era amigo de Zuleido Veras, o empreiteiro dono da construtora Gautama, pivô do escândalo. Mas relutou em contar detalhes sobre a amizade. Bruzzi disse que ajudou o empresário. “Naquela época, eu sugeri algumas ideias. Posso ter ajudado em orientações técnicas do que fazer aqui e ali. Eu posso ter feito alguma coisa em termos de captação de recursos externos, mas não me recordo exatamente o quê. É muito tempo atrás. Mas foi só isso. Foi um determinado serviço, em determinada época. Acabou. Nunca mais.”, Renan Calheiros não quis conversa: “Obrigado pela cobertura. Obrigado por tudo. Obrigado”. O deputado Henrique Eduardo Alves também não quis se pronunciar.
Revista Época
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