Foto: Geraldo Magela/Agência Senado e Reuters
A retirada do sigilo da colaboração premiada de Mauro Cid mostra que o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro mudou de forma relevante a sua versão sobre pontos capitais da trama golpista em uma audiência em que o ministro Alexandre de Moraes ameaçou decretar a sua prisão, revogar a colaboração e seguir investigações que atingiriam seus familiares.
Em 21 de novembro de 2024 o tenente-coronel compareceu à sala de audiências do STF (Supremo Tribunal Federal) pressionado por pedido da Polícia Federal e parecer da PGR (Procuradoria-Geral da República) favorável à sua prisão por descumprimento dos termos do acordo.
Investigações da PF com base em busca e apreensão mostravam elementos que colidiam com afirmações feitas até então por Cid.
Presidiu a audiência o próprio Moraes, que assim começou a sua manifestação na reunião. “Então nós vamos começar de forma bem direta, o que caracteriza o meu estilo”. Mais adiante, afirmou que aquela era a “última chance” de Cid dizer a verdade.
Nesse dia, Cid afirmou que uma reunião ocorrida em novembro de 2022 na casa do general Braga Netto —que foi candidato a vice na tentativa de reeleição de Bolsonaro— tinha o objetivo de promover “caos social” para justificar intervenção das Forças Armadas para manter o presidente no poder.
Antes, o tenente-coronel dizia que a reunião era um mero encontro de militares que queriam tirar foto com Bolsonaro e Braga Netto.
Mauro Cid ainda mudou sua versão sobre a saída antecipada do encontro dos tenentes-coroneis Rafael de Oliveira e Helio Ferreira Lima com Braga Netto, em 12 de novembro de 2022. Nos primeiros depoimentos, o militar disse que deixou a casa de Braga Netto porque precisava cumprir agenda no Palácio do Alvorada.
Diante de Moraes, porém, Cid disse que foi Braga Netto quem pediu para ele deixar sua casa após os militares começarem a conspirar contra Lula.
“Quando entrou no nível das ideias, o general Braga Netto interrompeu e falou assim: ‘Não, o Cid não pode participar, tira o Cid porque ele está muito próximo ao Bolsonaro'”, disse.
O delator disse que o encontro na casa de Braga Netto debateu formas de causar confusão para obrigar as Forças Armadas a aderirem ao golpe de Estado planejado por Bolsonaro e aliados.
“Na reunião se discutiu novamente a necessidade de ações que mobilizassem as massas populares e gerassem caos social, permitindo, assim, que o presidente assinasse o estado de defesa, estado de sítio ou algo semelhante”, diz o termo da reunião.
Cid também mudou a versão sobre mensagens em seu celular de militares pedindo R$ 100 mil no final de 2022. Antes, falava que era um pedido quase em tom de brincadeira, que nunca se concretizou e que tinha o objetivo de levar gente para os acampamentos em frente ao QG do Exército.
Na audiência diante de Moraes, mudou a versão e afirmou que não sabia o motivo exato do pedido de dinheiro.
Ele disse que, diante das informações levantadas pela investigação, acredita que o montante poderia ser usado para ações contra Alexandre de Moraes —como a prisão ou assassinato do ministro, como previsto no plano “Punhal Verde Amarelo”.
Cid ainda contou que tentou conseguir os R$ 100 mil com a direção do PL, mas o repasse foi negado. Depois, Braga Netto conseguiu dinheiro com “o pessoal do agro” e pediu para o ajudante de ordens entregar os valores para o tenente-coronel Rafael de Oliveira. O dinheiro vivo estava numa sacola de vinho, segundo Cid.
O termo da audiência relata que Moraes informou ter havido juntada de provas pela Polícia Federal que colidiam com depoimentos anteriores do colaborador, que estaria tentando “minimizar a gravidade dos
fatos”.
“O Ministro Relator ainda esclareceu que se as omissões e contradições não forem sanadas, nos termos da legislação vigente, isso poderá acarretar a decretação da prisão preventiva e a rescisão do acordo
de colaboração premiada, com efeitos não só para o colaborador, mas também em relação ao seu pai, sua esposa e sua filha maior”, diz o termo.
A fala de Moraes também está transcrita nos autos da delação.
“Eu gostaria de fazer um breve resumo, para demonstrar a importância dessa audiência, especialmente para o colaborador, o Coronel Mauro Cid”, diz o ministro, que passa a listar as contradições entre os depoimentos anteriores e as provas colhidas pela PF no curso da investigação, em especial o plano Punhal Verde Amarelo.
“O colaborador tem também não só benefícios, mas também obrigações”, diz Moraes.
“E as obrigações, a maior delas é não se omitir, não se contradizer. Não há, na colaboração premiada essa ideia de que só respondo o que me perguntam. Não! (…) Se não houver efetividade da colaboração, se a colaboração em nada auxiliou, não há por que, dentro dessa ideia de justiça colaborativa, a justiça premial, se dar os benefícios”, completa o ministro, acrescentando que Cid estava dizendo “uma série de mentiras na colaboração premiada”.
Nesse momento, Moraes sobe o tom e cita consequências, inclusive, para a família de Cid.
“Já há o pedido da Polícia Federal, já há o parecer favorável da Procuradoria-Geral da República, pela
imediata decretação da prisão, do retorno à prisão do colaborador”, diz o magistrado, que fala então na necessidade de Cid fazer “uma reflexão maior” para esclarecer omissões e contradições sob pena de prisão e de rescisão da colaboração.
O ministro acrescentou ao preâmbulo a afirmação de que aquela “era a última chance do colaborador dizer a verdade sobre tudo”.
Ele questionou especificamente a Cid qual era a participação de Bolsonaro e de militares de alta patente de seu governo no plano Punhal Verde Amarelo, no financiamento dos acampamentos golpistas e nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
Folhapress
Ou seja, o depoimento é flagrantemente nulo. Ops, estamos no Brasil, então…
‘Não, o Cid não pode participar, tira o Cid porque ele está muito próximo ao Bolsonaro’. Agora, explique como Bolsonaro queria o golpe?
Absurdo!
Pode isso Arnaldo?
A regra é clara, o magistrado tem que ser isento e não olhar a capa do processo.