O delegado Marcos Vianna, responsável pelo inquérito do incêndio na boate Kiss, disse que uma soma de quatro fatores contribuiu para a tragédia que matou 231 pessoas em Santa Maria durante uma festa universitária no último domingo (27). A combinação que influenciou no grande número de mortos reúne falhas e exigências de segurança desrespeitadas pela boate e pela banda, segundo ele. Até a manhã desta terça-feira (29), mais de 30 pessoas já haviam prestado depoimento na 1ª Delegacia de Polícia de Santa Maria.
Quatro pessoas foram detidas, com prisão temporária de cinco dias decretada. Entre elas estão os sócios da boate Kiss, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann. O vocalista e o responsável pela segurança do palco da banda Gurizada Fandangueira também estão detidos. Os integrantes da banda e Hoffmann foram transferidos para o Presídio de Santo Antão, a cerca de 7 km do centro da cidade. Spohr está internado em um hospital em Cruz Alta.
Para Vianna, quatro fatores, em especial, contribuíram para que o incêndio na Kiss deixasse um número tão grande de vítimas: 1) o fato de a boate ter apenas uma saída e a porta ser de tamanho reduzido; 2) o uso de um artefato sinalizador em um local fechado; 3) o excesso de pessoas no local e 4) a espuma usada no revestimento, que pode não ter sido a mais indicada e ter influenciado na formação de gás tóxico, contribuindo para as mortes.
Saída única
Sem saídas de emergência, a boate Kiss tinha apenas um acesso para entrada e saída de pessoas. A porta, quando totalmente aberta, chegava a uma largura de 3 m. Uma grade foi colocada para organizar a fila do lado de fora e atrapalhou a passagem das pessoas.
Artefato sinalizador
A apresentação da banda Gurizada Fandangueira foi interrompida após o grupo utilizar sinalizadores para uma espécie de show pirotécnico. Segundo relatos de testemunhas, faíscas de um equipamento conhecido como “sputnik” atingiram a espuma do isolamento acústico, no teto da boate, dando início ao fogo, que se espalhou pelo estabelecimento em poucos minutos. Segundo o estudante Murilo Tiecher e a fotógrafa Fernanda Bona, o vocalista da banda segurou uma espécie de sinalizador. O baterista e o guitarrista, em entrevista ao G1, afirmaram que os integrantes da banda não manuseavam os fogos, apenas a equipe técnica.
Excesso de pessoas
Os bombeiros relataram que o limite ideal era de 691 pessoas dentro da boate devido ao tamanho dela. O comandante do Corpo de Bombeiros de Santa Maria, Moisés da Silva Fux, disse que a estimativa de público presente no dia era de cerca de 1.300, mas ressaltou que só o laudo da perícia deverá atestar o dado.
Espuma
A espuma usada no revestimento do teto pode não ter sido a apropriada. De acordo com Moacyr Duarte, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em risco e emergência, o ideal é que elas contem com acabamento ignífugo, um tratamento têxtil que tem o objetivo de retardar o fogo em caso de incêndios.
Documentos e laudos
“Ainda não recebemos nenhum documento do Corpo de Bombeiros sobre em que fase estava o processo de renovação da licença da boate e se os requisitos exigidos haviam sido atendidos. Também não nos informaram ainda a capacidade, vamos trabalhar nisso nesta terça-feira (29)”, disse o delegado. A polícia entregou uma notificação à Prefeitura e ao Corpo de Bombeiros para que os órgãos enviem todas as documentações referentes à casa noturna.
A Polícia Civil também não recebeu os resultados das perícias do local e dos corpos, que irão fornecer informações sobre se o sinalizador usado pela banda provocou o incêndio e se “a espuma usada era ou não a mais indicada” para o local, informou o delegado Vianna. “Ainda não temos estes dados. Tudo isso será analisado”, disse.
Em depoimento, jovens que estavam na boate no dia da tragédia afirmaram que o integrante da banda responsável pela segurança do palco acendeu o sinalizador e o deixou no chão e que, enquanto o gaiteiro tocava, o vocalista pegou o sinalizador e levantou-o, segundo a polícia.
Segundo o delegado, ainda não há confirmação se o sistema de gravação das câmeras eletrônicas da boate estava funcionando ou não no dia do incêndio. “Dois CPUs foram apreendidos, mas não havia os gravadores dos vídeos neles. A versão dos sócios é que, apesar das câmeras, o sistema não funcionava”, disse.
Nesta terça-feira, a delegada Luiza Santos Souza, que registrou as mortes na madrugada de domingo, quando estava de plantão, continuará ouvindo sobreviventes que estavam na Kiss naquela noite.
Fonte: Folha de Notícias
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