A presidente Dilma sancionou nesta quarta-feira, 29, o projeto de lei de autoria da deputada federal Nice Lobão (PSD-MA) que reserva 50% das vagas nas universidades federais a alunos da rede pública. Dilma fez apenas uma alteração no texto aprovado pelo Senado no último dia 7 e determinou que a seleção dos estudantes dentro do sistema de cotas seja feita com base no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A presidente vetou o artigo 2º do texto, que previa que a seleção dos estudantes pelo sistema de cotas seria feita com base no Coeficiente de Rendimento (CR), obtido a partir da média aritmética das notas do aluno no ensino médio.
Dos 50% previstos pela lei, metade será destinada a estudantes cuja renda familiar é igual ou inferior a 1,5 salário mínimo por pessoa. Dentro desse universo de vagas destinadas a alunos oriundos da rede pública serão aplicados também critérios raciais. Estudantes autodeclarados negros, pardos e indígenas terão cotas proporcionais ao número desse grupo de pessoas que vivem no Estado onde está localizada a universidade, com base em dados do mais recente censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não importando a renda per capita do aluno – mas a exigência de terem cursado integralmente em escolas públicas permanece.
Em São Paulo, por exemplo, aproximadamente 30% da população se declara negra, parda ou indígena. Na Bahia, esse número chega aos cerca de 70%. No caso de não preenchimento dessa cota racial, as vagas remanescentes serão ocupadas por estudantes que fizeram todo o ensino médio na rede pública.
Para o diretor da Educafro, frei David Santos, a aprovação da lei é um grande marco para a educação brasileira. “As cotas darão oportunidade a pessoas capacitadas, mas não preparadas tecnicamente”, diz. Segundo ele, já há evidências de que alunos cotistas alcançam o desempenho dos demais já no primeiro ano da faculdade.
A seu ver, um novo debate será trazido à tona: o da meritocracia. “Muito se fala dessa questão, mas vale lembrar que ela pode ser injusta. Uma meritocracia justa é aquela que seleciona alunos distintos por diferentes tipos de avaliação”, diz. Frei David apontou o vestibular com um exemplo claro do que chama de “meritocracia injusta”, uma vez que o exame é aplicado a todo tipo de aluno.
“A sanção era inevitável, especialmente depois da decisão do STF que, em abril deste ano, já havia decidido pela constitucionalidade das cotas raciais”, diz Nina Ranieri, professora associada da Faculdade de Direito da USP e coordenadora da cátedra da Unesco. Na sua opinião, a lei assinada não é “inteiramente positiva”, pois traz uma série de questões que poderiam ser aprimoradas e interfere na autonomia das universidades. Nina discorda, entre outras coisas, do caráter racial do documento. “Essa medida é excludente”, diz. “Os dados sociais normalmente são suficientes para identificarmos quem precisa de apoio.”
Para a professora, a afirmação de que alunos cotistas acompanham os demais não deve ser encarada como regra. “Na maioria das vezes, eles chegam ao ensino superior com deficiências grandes, que acabam implicando em um alto índice de invasão”, afirma. Para minimizar este problema, segundo Nina, seria necessário a inclusão de programas de tutoria nas universidades, algo não previsto pela lei.
A lei de cotas modifica todo o sistema de divisão de vagas das universidades federais. Atualmente, quase todas utilizam algum sistema de cota social, racial ou de gênero, que deixarão de lado para adotar o modelo único. A lei não modifica o sistema de adesão nas universidades estaduais nem nas particulares, que poderão continuar a escolher se adotam ou não algum sistema de cotas.
Quem prestar vestibular no fim deste ano já poderá ser afetado pela Lei das Cotas. As universidades federais terão até quatro anos para se adaptar às novas regras, mas até um ano para adotar ao menos 25% do que a lei prevê – ou seja, terão de adotar o novo modelo de cotas em uma escala menor.
A federal que promove apenas um vestibular por ano terá necessariamente de adotar esse sistema de cotas em seu exame do final de 2012 ou início de 2013. Já universidades que realizam duas provas anuais, como a UnB, de Brasília, poderão adotar o novo sistema só em meados do ano que vem. Segundo o texto, a aplicabilidade desse sistema será revisada em dez anos.
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