Arte O Globo
A demora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para definir a reforma ministerial acirrou as disputas internas no PT. O partido corre o risco de perder espaço na Esplanada por causa da necessidade de acomodar legendas do Centrão enquanto enfrenta um tenso processo de eleição interna, que irá culminar na escolha, em julho, do sucessor de Gleisi Hoffmann na presidência. De forma reservada, diferentes lideranças reconhecem que há neste momento uma guerra de bastidores que envolve parlamentares e dirigentes pertencentes a grupos rivais.
Um dos focos de disputa se dá em torno do comando do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), atualmente com o petista Paulo Teixeira. Integrantes do governo e lideranças do partido identificam um movimento do deputado Paulo Pimenta (RS), titular da Secretaria de Comunicação Social (Secom) até janeiro, para se cacifar para o posto. Os dois já pertenceram à mesma corrente interna no passado, mas romperam em 2019 quando Teixeira apoiou a reeleição de Gleisi para a presidência do partido.
A gestão de Teixeira enfrenta críticas do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), historicamente ligado ao PT, pelo baixo número de assentados neste terceiro mandato de Lula. No fim do ano passado, os sem terra, que têm proximidade com Pimenta, chegaram a discutir a possibilidade de pedir a cabeça do ministro, mas desistiram de empunhar essa bandeira.
Por outro lado, Teixeira conta com apoio da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores (Contag), outra entidade do campo com relação histórica com o PT.
— O problema do MDA tem muito mais a ver com orçamento, que é bastante reduzido, do que com problema da equipe — afirma Aristides Santos, presidente da Contag.
A aliados, Pimenta nega estar fazendo qualquer movimento para se cacifar ao cargo porque, segundo ele, sabe que com Lula esse tipo de atitude não funciona. No Planalto, a troca no comando da pasta é tratada como possível, mas não como certa. Um outro nome citado como cotado para assumir o ministério é o atual presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, que tem ligação com o MST.
As disputas do PT também passam pelo comando da Secretaria-Geral, hoje com Márcio Macêdo e que pode ser assumido justamente por Gleisi Hoffmann.
Em conversas com seu grupo, o titular da pasta afirma que não identificou qualquer movimento de fritura. Ele atribui as notícias sobre a sua saída a uma articulação dos aliados de Gleisi que buscariam ocupar a presidência interina do PT até a eleição interna de julho. A ideia, segundo Macêdo, seria viabilizar um nome alternativo ao de Edinho Silva, o favorito de Lula para ocupar o posto.
Mas, de forma reservada, partidários de Edinho também tratam a substituição de Macêdo por Gleisi como certa. Se assumir a pasta, Gleisi terá que deixar a presidência do PT. No cargo, a atual dirigente terá como missão virar o jogo na relação do governo com os movimentos sociais.
Há um diagnóstico de paralisia na mobilização do governo junto à sociedade civil. Auxiliares do presidente veem necessidade de movimentos que apoiaram Lula em 2022 ajudem na defesa do governo ou mesmo no enfrentamento à extrema direita.
Ao mesmo tempo em que irá dar mais espaço para siglas do Centrão, Lula vê em Gleisi o melhor nome para organizar a militância de esquerda para recomeçar um trabalho de mobilização voltado para dentro da base lulista, numa estruturação que vá além do PT.
Presidente do PT desde 2017, Gleisi tem uma relação muito próxima com movimentos sociais que foi estreitada em momentos difíceis para a legenda, como nas manifestações contrárias ao impeachment de Dilma Rousseff e durante a vigília quando Lula esteve preso em Curitiba.
De acordo com interlocutores de Lula, a atual presidente do PT é um nome com autoridade dentro desses segmentos. Segundo ele, Gleisi deve mudar o tom da Secretaria-Geral da “água para o vinho”.
A presidente do PT também tem boa interlocução com MST. Há uma avaliação interna de que o governo poderia estar contando com apoio enfático de movimentos sociais e sindicados para “bater bumbo” para o projeto de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil — pauta que tem ampla aprovação populares e fura a bolha da esquerda.
A chegada de Gleisi no governo também alteraria a correlação de forças no Planalto. O núcleo mais próximo de Lula tem se reposicionado desde a saída de Paulo Pimenta e a chegada de Sidônio Palmeira à Secretaria de Comunicação Social (Secom), com fortalecimento do ministro da Casa Civil, Rui Costa, junto a Lula. Já Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), responsável pela articulação política, e Márcio Macêdo, têm atuação em áreas distintas e não são próximos.
Lula também estuda mexer em outro ministério comandado pelo partido, o das Mulheres. Nesse caso há chance de que Cida Gonçalves seja trocada pela também petista Teresa Leitão, senadora por Pernambuco. Seria um movimento para fazer um gesto a Silvio Costa, pai do ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho (Republicanos), que é suplente de Teresa Leitão no Senado. Costa foi vice-líder do governo Dilma Rousseff à época do impeachment, em 2016.
Ainda no contexto da reforma, o partido pode perder o posto de Padilha para um partido do Centrão. O líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), tem a preferência do grupo para ficar com o posto. A eventual saída do ministério desagrada a bancada de deputados da sigla.
O partido ainda é pressionado a ceder o comando do Ministério do Desenvolvimento Social, pasta responsável pelo Bolsa Família e hoje nas mãos do senador licenciado Wellington Dias. O petista vem acumulando desgastes desde a semana passada, quando O GLOBO revelou que ONGs não entregaram quentinhas contratadas por política social da pasta. Dias também anunciou a possibilidade de reajuste do Bolsa Família, e foi desmentido no mesmo dia pela Casa Civil. O anúncio, feito em entrevista, irritou Lula.
O líder do PSD, Antonio Britto (BA), é citado como cotado para o posto. Historicamente, o partido sempre resistiu a abrir mão do ministério que gerencia o principal programa social do governo federal.
Com a provável mudança na Secretaria-Geral, Lula pretende aplacar conflitos da sucessão do PT. A chegada de Gleisi, segundo petistas, limparia o caminho para Edinho Silva e desestimularia o surgimento de uma candidatura adversária que pudesse ampliar o racha interno da legenda.
Mesmo com a chancela de Lula, a candidatura do ex-prefeito de Araraquara sofre resistências na corrente majoritária do partido, da qual ele faz parte. Em busca de unidade, desde a semana passada Edinho passou a rodar o Brasil conversando com lideranças regionais do PT. Esteve no Maranhão, em São Paulo, e esta semana passará por Contagem (MG), Brasília, Recife, João Pessoa e Natal.
Os adversários internos dizem que Edinho não tem conseguido estabelecer um diálogo amplo com a tendência Construindo um Novo Brasil (CNB) e, por isso, busca apoios pontuais.
O perfil mais conciliador de Edinho seria um movimento para que Lula recupere o apoio das forças de centro que ajudaram a elegê-lo em 2022.
Líder do Movimento PT, segundo maior corrente interna e atual secretário de relações internacionais da legenda, Romênio Pereira anunciou a sua entrada na disputa durante reunião do diretório nacional em dezembro.
— Ao fazer uma reforma ministerial, (temos que) fazer com que o PT e os partidos progressistas tenham um aumento na participação no governo — defende o concorrente de Edinho.
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