A cadeirante Sandra Sousa, que trabalha no Call Center do Senac, é uma delas | Foto: Canindé Soares
Texto: Rosinaldo Vieira
Todos os dias de segunda a sexta-feira, Sandra Rejane de Sousa, segue uma rotina, como faz diversas outras mulheres pelo Brasil. Casada com o mecânico Edivan Lacerda há 18 anos, é mãe dos estudantes Guilherme, de 17 anos e Edivan Filho, de 15 anos.
Natural da capital Natal, 49 anos de idade e moradora do bairro de Pajuçara, na zona Norte há 20 anos, Sandra é sequelada de poliomielite desde um ano de vida, doença causada pelo polivírus. “Eu andava quando tive o vírus e a partir de então fiquei com paralisia dos membros inferiores e um membro superior, o braço direito”, explicou Sandra Sousa, o que a faz se locomover com o uso de uma cadeira de rodas.
Pela manhã ela trabalha com o marido, que tem uma oficina mecânica na residência do casal no bairro de Pajuçara, onde é responsável por toda parte administrativa da empresa, desde o contato com os clientes e fornecedores, gestão orçamentária e redes sociais.
Fotos: Canindé Soares
E além disso ainda cuida da casa, vai dirigindo seu carro adaptado para deixar os dois filhos na escola e na parte da tarde e noite, das às 13h20 às 19h40, vai para unidade do Senac Centro, para trabalhar no setor de call center. “Minha rotina é bem puxada”, disse Sandra Sousa
Aprendizado no Senac para vida
O know-how que Sandra aplica todos os dias, principalmente para ajudar na administração da oficina mecânica da família, ela atribui aos diversos cursos de capacitação que já realizou no Senac, uma das instituições que fazem parte da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do RN (Fecomércio RN), que neste ano de 2024 completou 75 anos de atuação em prol da sociedade e do desenvolvimento da economia potiguar.
Quando estava no último semestre do curso superior de Marketing na Universidade Potiguar (UnP), Sandra foi chamada para uma entrevista de uma vaga de trabalho no Senac. “Na época eu estava desempregada e como tinha feito um curso de Operador de Computador entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000, foram no banco de dados do Senac e me convocaram”, lembra Sanda Sousa.
E lá se vão 12 anos de atuação no Senac, sempre no setor comercial, no Call Center, como operadora de telemarketing. “Atualmente sou líder, trabalhando como assistente de área, coordenando as equipes, dando suporte para o desenvolvimento das atividades, desde responder a e-mails, atender ligações, tirar dúvidas sobre os cursos do Senac, junto com uma equipe formada por 17 pessoas”, explicou Sandra Sousa.
Pessoas com Deficiência (PCD) no Brasil
A Lei nº 13.146/2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência (PCD) no Brasil, coloca no seu artigo 2º que: “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através da realização da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), realizada em 2022, apontou o Brasil com cerca de 18,6 milhões de pessoas de dois anos ou mais de idade com algum tipo de deficiência.
Quanto ao mercado de trabalho, a PNAD Contínua 2022 aponta que em relação as pessoas que não apresentam deficiência, a taxa de participação na força de trabalho alcançou 66,4%. Já no caso das PCDs, essa taxa chega a 29,2%, percentual em que está incluída a Sandra Sousa em Natal, através do trabalho desenvolvido no call center do Senac Centro.
Estes dados demostram que as PCDs ainda têm um longo caminho a conquistar no mercado de trabalho no Brasil. Pelo menos a legislação brasileira tem contribuído para amenizar e contribuir para inclusão das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho.
A Lei Federal 8.213/1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, determina que as empresas com mais de 100 colaboradores devem destinar uma cota de 2% a 5% para pessoas com deficiência, sendo que até 200 empregados, 2%; de 201 a 500, 3%; de 501 a 1.000, 4%; e de 1.001 em diante, 5%.
Projetos da Fecomércio incentivam a inclusão de PCDs
Nestes seus 75 anos de existência a Fecomércio RN tem desenvolvido, através das suas diversas instituições, programas que incentivam a inserção no mercado de trabalho de pessoas, tanto com ou sem deficiência.
O Senac, por exemplo, tem investido bastante na qualificação profissional deste público, que são treinados e formados em áreas que vão desde gastronomia, biossegurança, TI, idiomas, comércio, área da beleza, como bem aconteceu com a Sandra Sousa há 12 anos.
Projeto Perten.Ser
Como forma de deixar a educação mais inclusiva para todas as pessoas que direta ou indiretamente apresentem alguma deficiência ou necessitam de um suporte diferenciado, o Senac criou no ano de 2022 o programa Perten.Ser, seguindo quatro pilares principais, que são o “Eu Sou”, “Eu Convivo”, “Eu Respeito” e “Eu Incluo” e desde então já ajudou a formar mais de 2 mil alunos PCDs, Já nas escolas do Serviço Social do Comércio (Sesc), nas suas várias unidades espalhadas no Rio Grande do Norte, são atendidas cerca de 180 crianças com deficiência, todas adaptadas especialmente para bem atende-las.
Cultura e PCDS
Além de incentivar a inclusão no mercado de trabalho, através de diversos cursos de formação profissional do Senac, o incentivo à cultura para PCDs também ganha importância, com o uso de recursos de acessibilidade através de projetos do Sesc RN, com o uso de Intérpretes de libras, que atuam em ações como o Sesc Literatura, Palco Giratório, Invasão Geek.
O Sesc também apoia projetos como o desenvolvido pelo grupo natalense Movidos Dança, formado por pessoas com deficiência e criado em 2018 pelo coreógrafo e diretor artístico Anderson Leão e pelo bailarino Daniel Silva, que têm se destacado com apresentações pelo Brasil com o espetáculo Nuvem de Pássaros.
Uma visão de mundo inclusiva
Quando perguntada sobre como encara sua deficiência, Sanda Sousa disse que não coloca essa sua particularidade como obstáculo para nada na vida. “Sempre ponho meus objetivos na frente de tudo. Conheço minhas limitações, mas isso não me limita em nada em ter uma vida normal. Enquanto isso, existem pessoas que vivem a reclamar da vida, mesmo sem nenhuma deficiência limitante, como no meu caso”, afirma Sandra Sousa.
Segundo ela, ainda existe muita gente preconceituosa. “Por outro lado, tenho que me policiar muito, para não ser intolerante com quem pratica algum tipo de discriminação”, disse Sandra.
Ela avalia que suas maiores dificuldades são vivenciadas na arquitetura urbana de Natal, que não é adaptada para PCDs. “No Centro da cidade e no Alecrim não consigo entrar nas lojas, pois faltam rampas de acesso. As lojas não são pensadas para cadeirantes”, denuncia Sandra Sousa, que trabalha com outras pessoas no Senac, que também são PCDs e até se formaram em cursos profissionalizantes desta instituição.
Sandra e o Senac
Sandra afirma que grande parte do que tem vivenciado na vida, em relação ao seu aprendizado educacional e atuação profissional é oriunda do Senac. Ela também realizou outros cursos em áreas que vão desde tecnologia da informação, gerenciamento de redes sociais, que ajudam, inclusive, na administração da oficina que administra junto com o marido Edivan Lacerda. Essa contribuição também se estende para seus dois filhos, que foram alunos no Ensino Fundamental 1 do Sesc
Atualmente o orçamento familiar da família de Sandra é formado pelo seu salário no Sesc, de cerca de R$ 1.900,00, além de aproximadamente R$ 10 mil que vem do trabalho com a oficina mecânica do esposo, que é natural da cidade de Exu, em Pernambuco, terra de origem do Rei do Baião, Luiz Gonzaga.
Para o filho Guilherme, sua mãe é sua grande inspiração. “Ela faz tudo por mim, meu irmão e meu pai e me apoia em tudo”, disse Guilherme, que pretende ser educador físico.
Já o outro filho, Edivan Júnior, disse que sua mãe é uma mulher guerreira; “Ela supera muitos desafios na vida”, disse Edivan Júnior, que pretende atuar na área de TI.
Enquanto isso o esposo Edivan Lacerda diz que Sandra é sua gerente nos negócios da oficina mecânica, esposa, amiga, dona de casa. “Ela é 80% da minha vida. Eu sou as pernas dela e ela é minha mente”, disse o esposo Edivan Lacerda.
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