A mineira Priscilla Rezende, 37 anos, vem criando inimizades na web há cerca de um ano. Seu blog, o Blogueira Shame, provoca reações de amor e ódio entre internautas aficcionados por modae beleza. Em mais de 2.900 posts, ela relata, com a ajuda de leitores, todos os “escorregões” das blogueiras de moda: desde erros de ortografia e gramática até a publicidade velada – quando blogueiras elogiam um produto em troca de algum tipo de remuneração ou “presente”, sem deixar este fato explícito ao leitor. Isso graças a Deus não acontece em Natal.
O teor escrachado – e em alguns casos cruel – de alguns posts publicados por Priscilla fez com que seu blog ganhasse muitos cliques – com visitas tanto de admiradores quanto de críticos, como as próprias blogueiras. Mais de 22 milhões de internautas já acessaram o Blogueira Shame desde setembro de 2011, com uma média de 200 mil pageviews diários. Segundo Priscilla, o blog não lhe rende nenhum lucro. “Só dores de cabeça”, disse a blogueira em entrevista ao site de VEJA.
Até julho deste ano, a identidade da Blogueira Shame era sigilosa. Mas, por um descuido de Priscilla ao se conectar em uma de suas redes sociais, foi descoberta. A notícia causou furor na web, lançou a autora na mídia e tornou seu blog ainda mais conhecido. Hoje, ela é convidada a discutir moda e internet em eventos renomados como o ‘YouPix’ e, de blogueira, tornou-se analista de redes sociais para empresas – apesar de sua profissão ser farmacêutica. “Quem realmente entende de moda, me adora. Jornalistas que admirei a vida inteira, de repente, viraram fãs do meu trabalho. A Julia Petit, por exemplo, sempre foi meu ídolo. Sem o blog eu nunca a teria conhecido pessoalmente”, afirma. Confira trechos da entrevista feita por Ana Clara Costa, para revista Veja:
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Veja.com – Há quanto tempo você inspeciona a atuação das blogueiras de moda na internet?
Priscilla Rezende – Desde setembro do ano passado, quando meu blog foi criado.
Veja.com – Quando nasceu em você essa percepção crítica em relação aos blogs?
P. R. – Eu tinha um blog de moda (o Sacola Phyna), vivia nesse meio e conheci muitas blogueiras. Aí eu ficava sabendo das histórias de bastidores e via as mentiras que elas contavam para as leitoras nos blogs e no Twitter. Antes mesmo de ter o Blogueira Shame, eu já criticava isso no meu Twitter pessoal. Venho alertando e criticando há uns três anos.
Veja.com – Qual foi a história mais controversa que já ouviu sobre publicidade velada em blogs?
P. R. – Há muitas. É difícil colocar uma em específico. O mais triste é que a maioria fala que comprou o produto ou ganhou de aniversário. Acho isso inaceitável. É uma mentira muito grande que engana as leitoras com muita facilidade. Recebo muitos emails de meninas me agradecendo por ter aberto seus olhos em relação a isso. Leitoras que gastaram tudo o que tinham para comprar os produtos que as blogueiras indicaram como “dica de amiga”, que “não vivem mais sem aquilo”, quando, na verdade, elas nem usaram o produto. Acho isso a pior parte, pois elas enganam adolescentes e fazem com que gastem tudo que têm e o que não têm para tentar acompanhá-las.
Veja.com – Seu blog de críticas lhe trouxe inimizades na blogosfera?
P. R. – Mais amizades do que inimizades. Quem não gosta de mim são as blogueiras gongadas. Quem realmente entende de moda, me adora. Jornalistas que admirei a vida inteira, de repente, viraram fãs do meu trabalho. A Julia Petit, por exemplo, sempre foi meu ídolo, em vários aspectos. Sem o blog eu nunca a teria conhecido pessoalmente.
Veja.com – Você é remunerada pelo seu trabalho no Blogueira Shame?
P. R. – Não, não ganho absolutamente nada. Só dores de cabeça. O meu antigo blog de moda não existe mais. Hoje, eu trabalho com produção de conteúdo e gerenciamento de redes sociais para empresas. Mas, na verdade, sou farmacêutica.
Veja.com – Como o mundo da moda chegou até você?
P. R. – Ah, eu sempre gostei. Nunca fui vítima da moda, mas sempre gostei de ler sobre os grandes estilistas, acompanhar o que acontecia. Por isso acho essas blogueiras tão burras. Elas não conhecem nada de história da moda e só sabem alguma coisa sobre a Chanel por causa do filme.
Veja.com – Os blogs de consumo, uma febre no mundo todo, são grandes estimuladores do comércio online de roupas e cosméticos. Na sua opinião, essa confusão ética que está acontecendo agora vai, de alguma forma, trazer mais transparência à atuação das blogueiras brasileiras?
P. R. – Acho que sim. Se não der em nada, pelo menos elas vão aprender que o negócio é sério, que existe o Código de Defesa do Consumidor e que elas devem segui-lo como qualquer outro veículo de publicidade. Entenderão que as coisas não funcionam como elas querem só porque estão escrevendo em blogs. É preciso que saibam que, a partir do momento que vendem espaços para publicidade, as regras são outras. Aliás, quem trabalha sério já faz isso desde sempre, não é?
Veja.com – Acredita que há certa saturação de blogs de moda? Leitores e marcas já estariam saturados desse tipo de mídia?
P. R. – Já está havendo isso. Os leitores já estão se cansando e os blogs estão perdendo credibilidade com o público em geral, agências e marcas. São raros os blogs que continuam crescendo. O boom já passou e há dados para comprovar isso. Muitos blogs famosos só têm fama mesmo, pois os números são ridículos.
Veja.com – Você acha que haverá uma nova fase de blogs de moda, diferentes dos atuais?
P. R. – Acho que elas vão procurar se especializar mais e aumentar o leque de assuntos abordados. Não vão acabar, mas acho que vão procurar cada vez mais um diferencial, profissionalizar, deixar de lado esse modelo de “blog pessoal”, de “meu cantinho virtual” porque elas sabem que isso não existe mais. Há alguns anos, blogs eram espaços pessoais das meninas. Elas realmente davam opiniões verdadeiras sobre produtos e não eram pagas para dizer que adoraram o batom X. É claro que ainda existem blogs pequenos que fazem isso, mas os de grande alcance acabaram com esse caráter pessoal há tempos. Hoje elas falam bem de quem paga bem.
Veja.com – A tendência é que haja cada vez mais os “publiposts” (postagens em que a blogueira afirma que está sendo paga para isso)?
P. R. – Certamente, porque o blog sempre será um veículo barato de publicidade em comparação com outros
Veja.com – O modelo de resenha de produtos cedidos por empresas, que é muito utilizado por jornalistas de tecnologia, não seria uma forma de tornar blogs mais transparentes?
P. R. – Esses testes já acontecem. Mas eles são pagos e, geralmente, as opiniões são sempre favoráveis – mesmo que a blogueira não tenha gostado do produto.
Veja.com – Blogueiras criticam para valer alguns produtos em seus posts?
P. R. – Não muito, apenas dizem que não gostaram.
Veja.com – Por quê?
P. R. – Em primeiro lugar, vem o medo de ficar queimada com a marca, com a assessoria e não receber mais produtos. Em segundo, uma pessoa que não sustenta sua própria opinião não tem senso crítico nenhum.
Veja.com – Quais blogs de moda você indica?
P. R. – Gosto muito do Oficina de Estilo e do Petiscos (de Julia Petit). Dos estrangeiros, gosto dos blogs de street style, como o The Sartorialist e da Garance Doré, que mostram a moda de verdade.
O blog potiguar Nathy&JU, de Nathalya Farias e Juliana Flor, merecia uma chamada de destaque nesse blog.