Defesa Civil – 5.fev.25/Divulgação
Ao menos 800 imóveis protegidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) aguardam para serem reformados, enquanto a prioridade do órgão é realizar obras determinadas por decisões judiciais já transitadas em julgado.
Entre os imóveis que necessitam de restauro estrutural está o Convento e Igreja de São Francisco, no centro de Salvador, patrimônio nacional, cujo forro do teto despencou matando uma pessoa na quarta-feira (5).
Como mostrou a Folha, o Ministério Público Federal (MPF) há nove anos tenta que o Iphan e a ordem religiosa responsável pela igreja promovam reformas que o próprio órgão de patrimônio diz serem necessárias desde 2010.
Pelo decreto-lei, que desde 1937 rege a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, é do proprietário do bem a responsabilidade de mantê-lo em bom estado de conservação.
A mesma legislação diz que quando o dono não dispuser de recursos suficientes para realizar as obras de conservação e reparação necessárias, deverá informar ao Iphan. E este, em seis meses, “mandará executá-las, a expensas da União”.
Por todo o país, o Iphan é parte em diversos processos em que se cobra que o proprietário e a União reformem bens tombados, mas as decisões judiciais nem sempre são cumpridas. Tanto que, em 2023, ao abrir edital para selecionar projetos prioritários no âmbito do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o Iphan deu prioridade a propostas que “abordam bens com decisão judicial ou liminar transitada em julgado que determina a intervenção”.
Dada a situação de conservação de diversos bens acautelados pelo Iphan, o outro critério de prioridade foi para a recuperação de bens em risco ou estado de conservação precário. De acordo com o Iphan, foram selecionadas 144 obras que já tinham projetos desenvolvidos, mas com necessidade de atualização.
“Em razão da complexidade e do tempo necessário para elaboração de projetos de restauro no âmbito do patrimônio cultural, essa linha de ação permite o avanço nas etapas necessárias até a execução das obras”, explicou o Iphan.
O mesmo edital da gestão Lula (PT) também convocou estados e municípios a apresentarem propostas de arquitetura e engenharia para recuperação de bens acautelados pelo Iphan. A ideia é que, a partir desses projetos, as próximas intervenções sejam realizadas com planejamento e responsabilidade.
Nesta etapa foram apresentados 800 inscrições, de acordo com o Iphan, das quais 105 foram selecionadas para se tornarem projetos a serem executados no futuro. Só na formulação deles serão investidos R$ 41 milhões.
Já as obras vão consumir R$ 730 milhões ao longo de quatro anos, de acordo com o governo federal. O orçamento da União para este ano prevê R$ 254 milhões para obras de preservação do patrimônio histórico, um avança na comparação com os R$ 210 milhões do ano passado, em montante corrigido pelo IPCA.
Os valores são expressivamente maiores do que foi reservado para essa ação nas Lei Orçamentárias Anuais (LOA) nascidas no governo Jair Bolsonaro (PL). Com o Iphan dentro não mais de um Ministério da Cultura, mas sob o guarda-chuva do Ministério do Turismo, foram reservados somente R$ 39 milhões por ano, em média, para “Preservação do Patrimônio Cultural em Cidades Históricas”.
Sob Michel Temer, essa mesma rubrica do orçamento teve R$ 199 milhões em 2019 e R$ 243 milhões em 2018, em valores também atualizados.
A igreja de São Francisco, em Salvador, foi pelo menos o segundo edifício tombado pelo Iphan a ter seu teto vindo a baixo em menos de dois meses. Em dezembro, o telhado de duas lojas do Mercado das Tulhas, no Centro Histórico de São Paulo, caiu sem deixar vítimas.
Na última segunda-feira (3), dois dias antes do colapso do teto, o frade que geria a igreja de Salvador alertou o Iphan sobre uma dilatação no forro do local e solicitou uma vistoria técnica para avaliação da situação e encaminhamentos necessários, como mostrou a Folha.
O Iphan disse em nota que o pedido não trazia “indicação de situação emergencial”. “Tampouco houve qualquer comunicado da Defesa Civil Municipal, Corpo de Bombeiros ou outros órgãos a respeito de eventuais riscos”, afirmou o órgão.
Nesta quinta, o órgão federal começou a receber avisos semelhantes. Um desses avisos foi do Museu de Arqueologia de Itaipu (MAI), em Niterói, antigo recolhimento de Mulheres de Santa Teresa, que avisou estar com “graves problemas estruturais de diferentes ordens”, comunicados diversas vezes anteriormente, como infiltrações nos telhados e rachaduras nas paredes de ambas salas expositivas.
Citando a morte em Salvador, o museu pediu, desta vez em “caráter de urgência”, uma vistoria, para que novas tragédias não ocorram.
Folha de São Paulo
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