O BlogdoBG conversou, ontem a tarde, com um pessoa diretamente ligada ao assunto e ao trabalho que era exercido no Instituto Internacional de Neurociências de Natal. Pedindo para, por enquanto, não ser identificado, o mesmo disse que “a convivência com o professor Miguel Nicolelis é praticamente impossível” e que os problemas não são de hoje, já vem de algum tempo. “Ele é excêntrico, autoritário e minimiza o trabalho dos colegas daqui”, revelou a pessoa ouvida pelo Blog.
Por coincidência, a reportagem que vamos reproduzir, a seguir, da Tribuna do Norte, praticamente diz a mesma coisa:
A parceria entre a Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o cientista Miguel Nicolelis para a criação e instalação de um núcleo internacional de pesquisa na área de neurociências “trincou”. Apresentada à imprensa como “uma briga pessoal” entre pesquisadores sobre “acesso e uso de equipamentos”, a questão tem razões mais consistentes. Elas passam pelo “estilo pessoal de administração de Nicolelis”, como afirma um dos envolvidos, mas também estão relacionadas a autonomia da universidade em pesquisas bancadas por recursos públicos.
As dificuldades nas relações da equipe de pesquisadores vinculados a UFRN com Miguel Nicolelis e a Associação Alberto Santos Dumont (a organização social criada para gerir o Instituto Internacional de Neurociências de Natal – IINN) não são recentes. Vieram a público, agora, com a decisão do cientista Sidarta Ribeiro, um dos três idealizadores de um núcleo internacional de neurocientistas em Natal (os outros dois são Claudio Mello e Sergio Neuenschwander), de transferir equipamentos da UFRN que estavam na sede do IINN, em Macaíba, para o novo prédio do Instituto do Cérebro, em Lagoa Nova (Natal). A própria criação do Instituto do Cérebro fez parte, em abril deste ano, das tentativas anteriores para administrar os conflitos.
A reitora Ângela Paiva, em entrevista na manhã de ontem, expõe a tese de que se trata de “uma divergência pessoal entre pesquisadores que não põe em risco a parceria da UFRN com o IINN”. Mas, confirmou que deu o aval para a decisão de Sidarta Ribeiro de retirar os equipamentos da universidade que estavam com Nicolelis e que eles serão instalados no Instituto do Cérebro. De acordo com ela, Miguel Nicolelis já havia sido informado da transferência, em uma reunião realizada na semana passada.
Os equipamentos científicos – computadores, centrífugas e outros instrumentos – foram adquiridos pela UFRN mas, segundo Sidarta Ribeiro e mais sete pesquisadores que apoiam uma revisão na parceira com o IINN, “o acesso e o uso deles estavam proibidos a alunos dos cursos de pós gradução e graduação da UFRN”. Os equipamentos, no valor de R$ 6 milhões, foram adquiridos via convênio entre a AASDAP, a UFRN e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia.
A concepção da UFRN para o IINN em parceria com a ong de Miguel Nicolelis e a UFRN previa o uso compartilhado dos espaços físicos do instituto de neurociências, como também dos equipamentos. O objetivo final era “repatriar” neurocientistas brasileiros formados no exterior e também atrair pesquisadores estrangeiros. À UFRN ficaria responsável, principalmente, por viabilizar a fixação da equipe, contratando os pesquisadores para o quadro de professores; à ong de Miguel caberia a gestão administrativa e cientifica do instituto.
Entre 2003, ano de lançamento do IINN, e 2009, a universidade viabilizou a contratação de 14 professores (três deles estrangeiros) e implantou o curso de pós-graduação em Neurociências. Pessoalmente, Nicolelis conseguiu atrair doadores de peso, como Lily Safra, para o projeto; deu visibilidade internacional ao instituto e atraiu a atenção para os aspectos científico e social do trabalho do instituto em Natal e Macaíba.
A produtividade científica e acadêmica é analisada como positiva pela UFRN – os trabalhos publicados ficaram acima da média; 9 mestre e 2 doutores formados – mas, o mesmo não se pode dizer da interação com Miguel Nicolelis e o grupo mais próximo dele. Sérgio Neuenschwander, que voltou da Alemanha para trabalhar no IINN, falando para a Folha de São Paulo (edição de ontem), considera que “Nicolelis contribuiu imensamente, mas a gestão dele foi destrutiva”.
A queixa do grupo do qual Sergio e Sidarta fazem parte é quanto as limitações que desde 2008, aproximadamente, Nicolelis e a direção da AASDAP vem impondo às pesquisas e trabalhos acadêmicos dos graduados e pesquisadores da UFRN. “Nicolelis é centralizador e quer decidir o que deve ou não ser pesquisado. Além disso, por temperamento, é autoritário e, pela formação lá fora, tende a não acreditar nas capacidades locais”, comentou um dos envolvidos na questão, na condição de não ser identificado.
Reitora da UFRN tenta intermediar divergências
Para a reitora Ângela Paiva a “divergência” entre integrantes da Aasdap (organização que administra o IINN, presidida por Nicolelis) e do Instituto do Cérebro (criado pela UFRN e presidido por Sidarta Ribeiro) ocorreu devido a regras de distribuição de espaço e de acesso aos equipamentos. A reitora vem tentando intermediar o entendimento entre os dois grupos de pesquisadores e crê em uma solução para o impasse.
“Divergência é algo natural em grupos de pesquisadores. Alguns deles (do Instituto do Cérebro) já foram vinculados à Aasdap. De 2008 para cá, os concursos aconteceram e eles se tornaram professores da UFRN. As regras da Aasdap para administrar o espaço físico e os equipamentos são um pouco diferentes das regras da UFRN e é natural que conflitos aconteçam. Estamos buscando a convivência mais harmônica.”
Ângela Paiva ressaltou que na conversa mantida com Miguel Nicolelis, semana passada, ficou claro o interesse das duas instituições em manter o trabalho conjunto. “A ideia é que tracemos o modo de convivência dos dois grupos de pesquisa porque, enfim, a área estratégica é a mesma, a de neurociências”, enfatiza.
Segundo a reitora, o valor total dos equipamentos adquiridos pela UFRN para o Campus do Cérebro é de R$ 6 milhões, porém alguns, que já estavam em utilização, foram mantidos em Macaíba. “E mesmo com a transferência dos demais para a casa onde funciona o Instituto do Cérebro, eles se mantêm à disposição dos pesquisadores da Aasdap”, assegurou.
“Institutos não são concorrentes”
A reitora da UFRN, Ângela Paiva, afirma que a criação do Instituto do Cérebro pela UFRN, em dezembro de 2010, não representou uma concorrência ao IINN. “Ao contrário. Uma regra da UFRN é a de que, ao contratarmos professores e técnicos, eles precisam ter uma vinculação a um departamento ou instituto. Então essa criação era um passo necessário para que esses professores começassem a trabalhar como professores da UFRN”.
Ao todo, dez pesquisadores já integram o Instituto do Cérebro, pela universidade, e utilizavam a sede provisória em Lagoa Nova para desenvolver parte de suas atividades, aguardando a conclusão dos prédios em Macaíba. “Solicitamos que equipamentos que não estão sendo usados (em Macaíba) e que são tombados pela UFRN fossem trazidos para essa casa onde os professores estão atuando”, justificou.
A transferência, reforça, ocorreu após negociações com a Aasdap e o próprio Miguel Nicolelis. E mesmo em Lagoa Nova, os equipamentos continuariam à disposição dos pesquisadores do IINN que não possuam vínculo com a universidade. “Não há cisão. Acho até que a gente vai buscar mais parcerias. Vamos nos somar a Miguel Nicolelis, vamos ao Ministério da Educação, da Ciência e Tecnologia, para que avancemos na consolidação do Campus do Cérebro, em Macaíba.”
Para Nicolelis, afastamento de pesquisadores é “coisa trivial”
A TRIBUNA DO NORTE tentou, durante todo o dia de ontem, contato com os cientistas Miguel Nicolelis e Sidarta Ribeiro. Ambos não retornaram às tentativas de contato telefônico nem responderam aos e-mails. No final da tarde, porém, a secretária de Nicolelis enviou uma nota na qual afirma que a Associação Alberto Santos-Dumont para Apoio à Pesquisa (AASDAP), gestora IINN-ELS, e a UFRN continuam trabalhando em conjunto, visando concretizar o plano de criação do Campus do Cérebro em Macaíba.
“O fato de haver ajustes administrativos não significa cisão. Em relação ao grupo de pesquisadores da UFRN que está encerrando sua colaboração com os Centros de Pesquisa da AASDAP, nada impede que trabalhemos juntos no futuro. A missão do IINN-ELS, de usar a ciência como agente de transformação social do nosso país, continua sendo cumprida”, diz a publicação.
Ontem à tarde, através do twitter, Nicolelis caracterizou a saída do grupo de pesquisadores do Instituto como uma “coisa trivial”. “O IINN-ELS é irreversível. Foi apenas uma colaboração científica que acabou. Coisa trivial. A missão científica continua viva”, publicou. Em outra mensagem, desejou sorte ao grupo da UFRN. “Meus melhores votos aos pesquisadores da UFRN que decidiram criar o seu próprio instituto. Espero que eles prosperem muito”. O pesquisador marcou uma entrevista coletiva para amanhã, às 14 horas, em Macaíba.
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