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O governo fluminense concedeu, em 2010, isenção fiscal de R$ 10,9 mil para a Enoteca Fasano, luxuosa importadora de vinhos que pertence ao grupo Fasano de hotéis e restaurantes. Não existe lei para redução de impostos sobre vinhos importados, mas o governo de Sérgio Cabral (PMDB) fundamentou o benefício usando um decreto para venda de alimentos da cesta básica.
“Feijão; arroz; farinha de mandioca; açúcar refinado e cristal; café torrado ou moído; gado, aves, bem como os produtos comestíveis resultantes de sua matança, em estado natural, resfriado ou congelado…”, delimita o decreto 32.161, assinado por Benedita da Silva em 2002 e aplicado por Cabral em 2010.
O peemedebista tem sido questionado sobre a intimidade de suas relações com empresários depois que admitiu ter viajado num jato de Eike Batista para ir à festa de Fernando Cavendish, dono da construtora Delta. Reportagem de Terra Magazine revelou que empresas beneficiadas com redução de impostos pelo governo Cabral em 2010 doaram mais de R$ 7 milhões à campanha dele e ao PMDB do Rio. Os dados sobre as isenções estão em levantamento da Secretaria da Fazenda feito por solicitação do deputado estadual Marcelo Freixo (Psol-RJ).
A enoteca beneficiada pelo decreto da cesta básica não produz ou importa alimentos. “Existe um consenso na lei sobre isenção de itens da cesta básica, mas vinho eu tenho certeza que não é um desses itens”, constata a advogada tributarista da Fundação Getúlio Vargas, Vanessa Rahal Camado. “Não existe nenhuma justificativa, não há programa para incentivo de bebida”. O grupo Fasano foi procurado pela reportagem e ainda não deu retorno sobre o caso.
O produto mais barato encontrado na enoteca carioca do grupo Fasano é a meia garrafa do vinho do litoral chileno Isla Negra, que custa R$ 19,00. A mais cara é a garrafa do champagne rosé Krug, que pode ser levado para casa por R$ 1.640,00.
O Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Rio vai auditar, entre os dias 4 e 29 de julho, benefícios fiscais concedidos pelo governo ao longo do primeiro trimestre deste ano. O objetivo é checar se há isonomia e determinar quais são os impactos nos caixas do Estado.
Incentivo para motéis
A lista dos isentos tem ainda empresas inusitadas, como o Motel Champion. Identificado como hotel no site e na lista da Secretaria da Fazenda, o estabelecimento respondeu a Terra Magazine que é um “motel, com eme de Maria, com espelho no teto de todas as suítes”. O empreendimento recebeu R$ 5,9 mil em isenção de impostos desde 2007.
E o Champion não foi o único. Doze mil de isenção foram dados ao Motel Oklahoma, onze mil ao L’Amour Motel. Nestes três casos, o benefício foi concedido com base no decreto 34.681/2002, o qual trata de uma série de itens diversos, mas não se debruça, em nenhum momento, sobre incentivo a motéis. O decreto fala em filmes fotográficos, equipamentos destinados ao reaparelhamento, ampliação e modernização da infraestrutura aeroportuária, equipamentos destinados ao aparelhamento e modernização dos portos, importação de pescado, maçã e pera e softwares para computador.
Incertezas legais
No Brasil, os Estados não têm autonomia para isentar nenhum tipo de setor ou empresa. Eles dependem da aprovação do Confaz, que reúne todas as Unidades da Federação. “Só com a aprovação de todos os Estados, um governador pode oferecer a isenção”, explica Vanessa. “Mas, na prática, não é o que acontece, a oferta desses benefícios fiscais fica submetida a interesses locais”.
O governo Cabral isentou grandes construtoras, produtores e importadoras como a Odebrecht, a Queiroz Galvão e a fabricante de pneus Michelin. Em entrevista à rádio CBN nesta quarta-feira (29), Cabral ressaltou que são esses benefícios que atraem grandes empresas a fazer negócio no Estado. “Mas muitas vezes o que o Estado perde é muito maior do que os benefícios (como geração de empregos) que a empresa traz”, avalia Vanessa. Argumento evidente no caso dos motéis e vinhos.
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