Empresa que suspeita de aplicar golpes em prefeituras na venda de vacinas contra a Covid-19 se reuniu com agente infiltrado da polícia no Recife — Foto: Pedro Alves/G1
Os sócios da empresa investigada por aplicar golpes em prefeituras com falsas vendas de vacinas contra a Covid-19 participaram de uma reunião que contou com um agente infiltrado da polícia, segundo documento ao qual o G1 teve acesso.
O esquema foi descoberto depois que a prefeitura de Barra do Piraí, no Rio de Janeiro, desconfiou que era uma fraude e acionou a polícia.
Segundo a Delegacia de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro do RJ, responsável pela investigação, não havia indícios de que prefeituras de Pernambuco tenham sido contatadas, apesar de a reunião ter acontecido no Recife.
Os sócios diziam ser intermediários de uma empresa estadunidense que seria dona de meio bilhão de doses da vacina de Oxford/AstraZeneca, por, supostamente, ter financiado os estudos para a produção dos imunizantes (veja vídeo acima).
A empresa alvo da investigação é a Montserrat Consultoria, com sede no Poço da Panela, na Zona Norte do Recife. Pelo menos 20 prefeituras de todo o Brasil podem ter sido lesadas pelos criminosos.
Como foi a reunião
O G1 teve acesso à decisão judicial que autorizou o cumprimento dos mandados de busca e apreensão nesta quinta-feira (22) em Pernambuco. Nela, o juiz auxiliar da 1ª Vara Especializada do Rio de Janeiro Bruno Monteiro Ruliere cita a reunião realizada no dia 12 de abril, após uma “carta convite” expedida pela Montserrat Consultoria.
Segundo o documento, participaram da reunião Eduardo Henrique Meneses e José Klleber Queiroz Malaquias, ambos sócios da Montserrat, além do agente infiltrado da polícia, que acompanhou o prefeito de Barra de Piraí, Mário Reis Esteves (Republicanos), que foi quem denunciou o esquema.
O encontro aconteceu em uma sala compartilhada por duas das empresas dos investigados (veja vídeo abaixo), a Montserrat Consulting e Hat Soluções Inteligentes, no edifício empresarial Casa Forte Corporate, mesmo local onde foram cumpridos mandados de busca nesta quinta-feira (22).
Os dois homens, na reunião, afirmaram ter negócio jurídico com a Oxford/AstraZeneca, “o que lhes conferiu o direito de receber vacinas contra o Covid-19 e que ora pretendem revender ao ente municipal”, disse o juiz. A fornecedora do imunizante Oxford/AstraZeneca negou qualquer negociação com os suspeitos.
Os criminosos entravam em contato com as prefeituras por e-mail ou WhatsApp e exigiam pagamento antecipado, segundo o delegado Thales Nogueira, da Delegacia de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro, do Rio de Janeiro.
“Eles entravam em contato por e-mail, por WhatsApp e depois mandavam uma minuta de contrato que exigia o pagamento antecipado ou por swift, que é uma remessa internacional, ou por carta de crédito internacional”, afirmou.
O contrato, ao qual o G1 teve acesso, apontou que seriam vendidos a Barra do Piraí 4,5 mil frascos contendo dez doses cada um. Cada frasco custaria US$ 7,90, o que daria aproximadamente R$ 44.
Nas investigações, a polícia também descobriu que esses dois sócios abriram, neste ano, duas empresas, cada uma com capital de R$ 7 milhões: VGL Administração de Participações, cujo proprietário é Eduardo Leal, e RWX Participações, de José Klleber.
O delegado Thales Nogueira afirmou que foram expedidos oito mandados de busca e apreensão em Pernambuco. Alguns deles foram em residências dos sócios da empresa, na Madalena, Zona Oeste do Recife, e num resort de luxo na Praia de Muro Alto, no Litoral Sul.
Ele disse ainda que a Ecosafe Solutions, empresa que supostamente seria detentora das vacinas, sequer aparentava ter estrutura para ser capaz de fazer esse tipo de transação.
“A empresa que ela diz representar nos Estados Unidos é uma empresa recém-criada, é uma empresa que funciona num coworking, o que não é normal pra uma empresa desse porte e várias inconsistências que levaram o Juízo da Primeira Vara Criminal Especializada do Rio de Janeiro a definir oito mandados de busca e apreensão. Tanto na sede da empresa, aqui, quanto na residência dos sócios relacionados”, afirmou.
Em Pernambuco, foram apreendidos documentos, celulares e computadores. Os donos da empresa deverão ser intimados a depor posteriormente, depois que o material recolhido for analisado.
O delegado afirmou, ainda, que as próximas fases da operação serão voltadas a identificar os municípios que podem ter sido prejudicados pelos golpistas. Entre os municípios que receberam a oferta estão Duque de Caxias e Barra do Piraí, no Rio de Janeiro, e Porto Velho, em Rondônia. Somando apenas esses contratos, o golpe renderia quase R$ 70 milhões.
Negociação com prefeituras
Caxias chegou a assinar um contrato de intenção para compra de um milhão de vacinas no valor de R$ 45 milhões, mas teria voltado atrás devido à forma de pagamento exigida pela empresa, segundo o delegado.
Porto Velho negocia há mais de um mês a aquisição de 400 mil doses. O acordo passa por uma inspeção do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia. Ao todo, R$ 20 milhões foram investidos para a compra das vacinas. O dinheiro está bloqueado e só seria liberado com a remessa embarcada. O prefeito da cidade, Hildon Chave, afirmou que não há risco de prejuízo financeiro.
“Até agora, o que se sabe é que eles se colocavam na posição de sócios da empresa e diziam que intermediavam para uma empresa americana. Ela se diz uma empresa de tecnologia, uma empresa que trabalha com Lei Geral de Proteção de Dados, mas não localizamos nenhum contrato consistente que possa dar lastro a nenhum contrato desse, internacional”, afirmou o delegado.
O G1 tentou contato com os sócios da Montserrat Consultoria e com a Ecosafe Solutions, mas nenhum deles atendeu aos telefonemas da reportagem.
G1
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