Saúde

Exame de colesterol deve começar na infância para reduzir casos da doença, alertam cardiologistas

Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

Na infância, você sabia como andava seu colesterol? E, das crianças e adolescentes de sua família, faz ideia de como estão os níveis? O exame de colesterol, item básico no check-up de adultos e idosos, ainda não faz parte do protocolo na pediatria no Brasil. Mas deveria, defendem cardiologistas, uma vez que identificar problemas desde cedo reduz danos cardiovasculares maiores na vida adulta e são essas as doenças que mais matam no país. Cerca de 70% dos óbitos têm essa causa por aqui.

Nesta segunda-feira, a Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) lança uma campanha para que o rastreamento lipídico — como também é chamado o exame — vire rotina para os pequenos. A entidade passa a recomendar que, em geral, crianças de 10 anos ou mais façam esse acompanhamento. No caso de famílias com histórico de doenças cardiovasculares (infarto e AVC, acidente vascular cerebral, por exemplo) e de colesterol alto provocado por questões genéticas (a chamada hipercolesterolemia familiar), a medição deve começar antes, aos 2 anos.

O alerta da campanha vale tanto para o público em geral quanto para os próprios médicos, já que o entendimento, errôneo, de que o colesterol elevado é um risco focado nos adultos ainda permeia os dois grupos, diz a médica Maria Cristina Izar, diretora de Promoção e Pesquisa da Socesp. Resultados do Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA), realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 2016, que embasa a diretriz do órgão paulista, mostram que os patamares altos afetam de 30% a 40% das crianças e dos adolescentes do país.

— Desde que a pessoa nasce, temos várias oportunidades de intervir precocemente. Mas por que isso não acontece? As pessoas não frequentam médico com uma periodicidade adequada ou, mesmo se vão pediatras, nem todos não acompanham a circunferência abdominal, o peso, a pressão, a medição de colesterol — destaca Izar.

O ideal é identificar cedo o problema e adotar, se preciso, desde o início da vida, uma dieta mais saudável, e, para os casos em que a alimentação não seja a principal causa, como nos genéticos, tomar medicação que controla os níveis, explica a médica. Ter colesterol alto já na infância é fator de risco para infartos e AVCs, entre outros problemas, na vida adulta, ou até mesmo antes, em episódios mais extremos.

A pandemia, lembra Izar, também piorou a prevenção em algumas famílias que, com medo do coronavírus, adiaram suas revisões.

— A Covid atrapalhou, sem dúvida. Pacientes deixaram de procurar os serviços, e também os próprios médicos se afastaram e desviaram o foco — preocupa-se.

Políticas públicas

Neste ano, mudar a prática na pediatria é a bandeira principal do grupo para o Dia Nacional do Combate ao Colesterol Elevado, que será celebrado em 8 de agosto. Com a proximidade da data, a entidade paulista também reencaminhará nesta semana ao Ministério da Saúde um documento em que pede, entre outros pontos, que os exames de colesterol sejam solicitados nos atendimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir dos 10 anos para todos e, para aqueles com questões prévias na família, já aos 2.

A recomendação foi inicialmente encaminhada pela Socesp ao Ministério da Saúde em novembro de 2020. Desde então, de acordo com a entidade, oito meses se passaram sem qualquer retorno ao documento, que traça, para além da questão do colesterol entre os mais novos, um plano completo para a diminuição de doenças cardíacas no país até 2030.

Procurado pela reportagem, o Ministério da Saúde não respondeu se pretende ou não considerar as medidas propostas. Hoje em dia, o exame é coberto pelo SUS, caso o médico peça, em todas as idades. A questão é que não existe um protocolo para sua solicitação na infância.

Jorge Yussef Afiune, médico que é presidente do departamento científico de cardiologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), considera importante a adoção do exame de colesterol nessa época da vida, como pede a Socesp. No entanto, ele ressalta, essa medida é só uma parte de uma série de melhorias necessárias para evitar as doenças cardiovasculares, nas quais “estamos falhando em muitas frentes”.

— Fazendo um paralelo com a Covid, as doenças cardiovasculares são uma pandemia. Elas acometem o mundo inteiro e têm raízes em um estilo de vida mundial. Vemos um aumento da prevalência da obesidade infantil, independentemente da miséria e do nível social — resume. — Precisamos de uma política pública global, não só de um tratamento individual do médico com seu paciente no seu consultório [em caso de colesterol alto] — completa.

Afiune pontua ainda que receber um resultado bom no exame de colesterol não é garantia de estar saudável em outros aspectos. Pais e profissionais precisam estar atentos à qualidade da alimentação e à atividade física dos pequenos mesmo nesses casos.

O Globo

 

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