A prisão de um entregador de pizzas na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, mobiliza a comunidade acadêmica de São Paulo e de outros dez Estados.
Um abaixo-assinado com 238 nomes — na maioria, de intelectuais — em favor de Gabriel Scarcelli Barbosa, de 28 anos, foi anexado ao processo que corre na 5ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Filho da professora Ianni Regia Scarcelli, do Instituto de Psicologia da USP, Barbosa espera, desde 22 de julho, que seu pedido de liberdade seja julgado.
O rapaz havia sido detido um mês antes, em 21 de junho, na pizzaria em que trabalhava havia seis anos, perto de sua casa, na Vila Mariana. A Justiça chegou a determinar sua liberdade em 20 de julho, mas um novo pedido de prisão, emitido no dia seguinte, impediu que ele fosse beneficiado pelo alvará de soltura: ele segue no CDP 4 de Pinheiros.
Superlotada, a cadeia comporta atualmente 1.080 presos, embora sua capacidade máxima seja de 566 pessoas.
Assinaturas
Entre os nomes que constam do abaixo-assinado estão professores dez unidades da USP: Escola de Comunicações e Artes; Faculdade de Direito; Faculdade de Educação; Escola de Enfermagem; Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas; Faculdade de Medicina; Instituto de Psicologia; Faculdade de Saúde Pública; Faculdade de Artes, Ciências e Humanidades do campus USP Leste; e Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras do campus de Ribeirão Preto.
O manifesto ainda conta com o apoio de docentes de outras nove universidades paulistas: Mackenzie; Universidade Presbiteriana Metodista; PUC-SP (Pontifícia Universiada Católica de São Paulo); Santa Casa; UFSCar (Universidade Federal de São Carlos); Unesp (Unversiade Estadual Paulista); Unicamp (Universidade Estadual de Campinas); Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e Unip (Universidade Paulista).
Há também assinaturas de professores das universidades federais da Bahia; do Espírito Santo; de Mato Grosso; de Minas Gerais; da Paraíba; do Paraná; do Rio Grande do Norte; de Roraima; de Santa Catarina; e da Universidade Federal Fluminense; além de outras seis universidades particulares desses Estados.
Reconhecido cinco meses depois
O pedido de habeas corpus em favor de Barbosa é assinado pelo advogado Luiz Eduardo Greenhalgh — filiado ao PT e conhecido por defender presos políticos na época da ditadura militar — e por dois auxiliares.
No documento, os defensores contestam a isenção do delegado da Polícia Federal responsável pela investigação.
Vítima de roubo dentro de uma oficina mecânica da Vila Mariana em agosto de 2013, o delegado Kleber Isshiki conduziu as apurações que levou à prisão dos acusados, moradores da favela Mário Cardim, na rua de mesmo nome, Vila Mariana.
Barbosa não estava entre os indiciados, mas aparecia, com outras pessoas, em fotos postadas pelos detidos no Facebook. Nascido em uma família de classe média, o entregador de pizzas namora com uma moradora da favela Mário Cardim — com quem tem uma filha de 11 meses — e possui amigos na comunidade. Quando foi preso, construía uma casa na favela, onde pretendia morar com a namorada e a filha.
O delegado Isshiki recolheu as imagens nas páginas dos acusados que havia identificado e as apresentou a vítimas de outros roubos na região. Barbosa foi reconhecido, por fotografia, em dois casos.
Os advogados ressaltam, no pedido de liberdade, que os dois reconhecimentos foram feitos em fevereiro do ano passado, cinco meses após o roubo a uma das vítimas e sete meses após o roubo a outra.
Exagero
Há duas semanas, o desembargador Sérgio Ribas, responsável pelo processo do habeas corpus, referiu-se ao abaixo-assinado como exagerado.
“Tangente ao abaixo-assinado cabe referir que é elevado o número de aderentes. Por elevado, caberia dizer do excesso, e, portanto, do exagero”, escreveu. “Pertinente ao exagero, urge lembrar: ‘Enfraquece-se sempre tudo que se exagera’ (La Harpe). E ainda: ‘Um exagero é sempre a exageração de algo que não o é’ (Ortega Y Gasset).”
O magistrado, então, reiterou pedido de informação à instância inferior, onde o caso ainda tramita. “Respeitando pretensão da combativa defesa, mister, para formação de convicção, elucidação pleiteada junto à primeira instância. Aguarde-se, portanto, resposta da E. Vara. 3. Reitere-se pedido de informações, junto à 16ª Vara Criminal da Comarca da Capital/SP.”
A manifestação do juiz foi publicada, em um nota crítica, no site da Adusp (Associação dos Docentes da USP). E, desde então, o abaixo-assinado cresceu. No domingo (30), o documento reunia 540 nomes.
R7
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