Segurança

Prisões brasileiras têm 310 mil vagas, mas abrigam 548 mil detentos

PRODNONIAO Complexo Penitenciário de Pedrinhas, onde, só neste mês de outubro, 14 presos foram mortos em duas rebeliões, não é um caso isolado no sistema prisional brasileiro. No país, onde 548 mil detentos ocupam um espaço com capacidade para abrigar 310 mil — segundo dados de dezembro de 2012 do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias, do Ministério da Justiça — , a violação de direitos constitucionais mais parece regra do que exceção, considerando problemas identificados em inspeções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como a precariedade das instalações, a falta de assistência médica e a existência de pessoas que já cumpriram a pena, mas permanecem detidas. Não à toa, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou, em 2012, que “preferia morrer” a passar muitos anos em uma penitenciária brasileira.

— A separação dos detentos em razão da natureza do delito, ficando os mais graves, como tráfico, estupro e homocídio, de um lado e os mais leves de outro, praticamente não é feita em presídio algum, numa clara violação à regra constitucional, que estabelece a divisão por natureza do crime, sexo e idade. Também não é garantido o direito de a presidiária permanecer com o filho no período de amamentação. Só por esses dois exemplos a gente percebe como os direitos fundamentais das pessoas presas estão sendo violados — destaca o desembargador Guilherme Calmon, conselheiro do CNJ.

Segundo Calmon, o descumprimento de normas básicas pode gerar uma situação favorável ao surgimento de rebeliões e à ação do crime organizado dentro das unidades prisionais:

— Com isso, começamos a ter um outro problema, relativo à ação do crime organizado em estabelecimentos penais. Essa situação na qual essas pessoas estão inseridas gera fugas e rebeliões e elas acabam saindo, após cumprirem a pena que lhes foi imposta, pior do que entraram. Vão rescindir e praticar outros crimes, muitas vezes, mais graves do que os cometidos anteriormente — avalia.

“O detento é cooptado pela facção. Ou se filia ou morre”

No Maranhão, por exemplo, a separação dos presos nas unidades prisionais costuma ser feita com base na facção criminosa do detento, revela o juiz Douglas de Melo Martins, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do CNJ.

— A divisão é feita, principalmente, pela facção. Com isso, a pessoa que comete um crime leve acaba, por exemplo, na mesma cela de alguém que cometeu um crime mais grave, de um líder de uma organização criminosa. E aí não é nem questão da prisão ser uma escola do crime. Na verdade, o detento é cooptado pela facção. Ele não tem opção. Ou se filia ou morre.

Exemplo disso, cita o juiz, é o borracheiro que foi detido por ter adquirido pneus furtados e acabou assassinado na rebelião desta quarta-feira em São Luis.

— Sei que deve ter muita gente falando ao ouvir a notícia da rebelião: “Ah, 10 mortos presos? É bom, são menos 10 criminosos no mundo”. Mas um desses mortos é um borracheiro, que foi detido após acusação de ter comprado pneus furtados. A sociedade é muito hipócrita.

Segundo o juiz, o Complexo Penitenciário de Pedrinhas tem um histórico de tragédias e passa por uma situação “de descontrole”. Além das 9 mortes registradas nesta quarta-feira, no Centro de Detenção Provisória, onde presos aguardam julgamento, outras cinco ocorreram no início deste mês. Em 2011, um motim que durou cerca de 24 horas terminou com 18 presos assassinados. À época, a polícia também divulgou que as mortes foram resultado de briga entre facções rivais.

Não à toa, este ano, lembra Martins, a demolição do Complexo de Pedrinhas foi recomendada por um juiz da Vara de Execuções Penais do Maranhão:

— O juiz disse que a situação era tão ruim que nem reforma resolvia. Além disso, tem o problema da superlotação. Na unidade onde ocorreu a rebelião tem quase 700 presos onde deveriam existir 200.

O Globo

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