O Estado de S.Paulo
O turista brasileiro tornou-se muito bem-vindo nas lojas dos EUA. Está em terceiro lugar na lista dos maiores gastadores, abaixo de japoneses e britânicos e acima de alemães, franceses e sul-coreanos. Não é tão rico quanto seus concorrentes na corrida às compras, mas tem feito o possível para ajudar a recuperação do varejo norte-americano. Sua posição no rol dos grandes consumidores estrangeiros se tornou conhecida graças a um relatório do Departamento do Comércio dos EUA. Não há informação precisa a respeito de seus gastos em outros países, mas também devem ser apreciáveis.
O turista brasileiro sempre foi um comprador entusiasmado, disposto a embarcar de volta com malas estufadas e uma porção de pacotes difíceis de acomodar no avião. Mas a figura desse consumidor nunca foi tão notória e tão celebrada quanto nos últimos tempos, graças a dois fatores: a forte valorização do real e o aumento do contingente em condições de viajar para o exterior.
Alguns acharão estranho – e até censurável – brasileiros deixarem nos EUA, em média, US$ 5.918 por viagem, gastando mais que alemães, franceses e australianos. Afinal, o brasileiro de classe média, mesmo aquele com dinheiro suficiente para férias no exterior, tem quase sempre uma renda menor que a dos turistas da Europa ou dos países mais desenvolvidos da área do Pacífico. Mas é preciso levar em conta alguns fatores especiais, para entender essa diferença de comportamento. Não há nada de muito estranho, nem de reprovável, nesse turismo consumista.
O turista brasileiro sempre foi um grande comprador, em primeiro lugar, porque o Brasil tem sido por muito tempo uma economia muito fechada. Continua sendo, mesmo depois da abertura do mercado a partir do início dos anos 90. Cidadãos de países mais abertos têm acesso muito mais fácil a uma variedade enorme de produtos. Além de estar disponíveis no comércio local, esses produtos são quase sempre muito mais baratos do que no Brasil, onde a carga tributária sobre importados é tradicionalmente muito pesada. Aí estão, portanto, dois importantes fatores combinados: disponibilidade do bem e preço.
Isso explica, por exemplo, a disposição de futuras mamães brasileiras de ir a Miami para comprar enxovais para bebês. Ou o entusiasmo das compradoras diante das prateleiras de cosméticos, não só muito mais baratos, mas também muito mais variados que os oferecidos nas lojas de São Paulo ou de qualquer outra grande cidade do Brasil. Produtos eletroeletrônicos têm múltiplos atrativos, porque neles se combinam a variedade, a novidade tecnológica e – naturalmente – o preço. De modo geral, qualidade também faz diferença para os compradores. Falta acrescentar, naturalmente, a diferença entre os custos de estada no exterior e os preços correntes em hotéis e restaurantes nas cidades turísticas brasileiras.
A valorização do real, combinada com uma inflação interna bem acima da média dos países desenvolvidos, já seria uma explicação razoável para o turismo gastador dos brasileiros, mas o quadro, como se vê, é mais complexo e alguns de seus componentes – como os altos impostos de importação – estão presentes há muito tempo.
Tudo isso remete, mais uma vez, aos bem conhecidos problemas da voracidade fiscal e da insuficiente competitividade da economia brasileira. Turistas – brasileiros, chilenos, alemães ou britânicos – sempre acharão algum produto atraente para comprar no exterior. Mas turistas de países subdesenvolvidos e pobres normalmente aproveitam as viagens para comprar bens inacessíveis em seus mercados. O Brasil não é tão subdesenvolvido nem tão pobre, mas suas instituições, seus costumes administrativos e sua tributação continuam sendo típicos de países muito mais atrasados.
Quando os impostos, a administração pública, os investimentos em infraestrutura e o ambiente de negócios forem mais parecidos com aqueles encontrados nos países de razoável grau de industrialização, o turista brasileiro de certo passará a agir como tantos outros em relação às compras no exterior.
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