Um cabaré chamado Alcaçuz, assim pode ser definido o Presídio Estadual de Alcaçuz, localizado em Nísia Floresta . Com todo respeito aos estabelecimentos de prostituição, em alguns casos bem mais “limpinhos” e parecem mais honestos, diga-se de passagem.
O trocadilho malicioso não tem intenção de faltar com respeito àquilo que deve ser tratado como assunto sério, a começar por aqueles que são delegados a lidarem com tais instâncias, e, principalmente, conduzí-las de maneira eficiente. A motivação dele é a tamanha indignação que só cresce cada vez que uma nova fuga neste presídio é divulgada. O motivo é não conseguir entender a razão de os gestores não saberem lidar com problemas antigos. Em sociedade, costumamos brincar dizendo que errar é humano, mas repetir o erro é burrice. Seguindo tal ditado popular, estariam sobrando “burros”, incopetentes, para todos os lados? Fica o questionamento sadio.
Passam os anos, mas o enredo é o mesmo. Parece um eterno “Vale a Pena Ver de Novo” de ingerências. A cada inspeção, drogas, armas, celulares, carregadores e uma infinidade de objetos são achados “malocados” em celas. No mundo em que vivemos nenhum desses itens possui pernas próprias. Eles entram com ajuda de alguém e atravessam portas ou muros. Onde estariam os olhos dos agentes penitenciários e policiais militares, responsáveis pela guarda externa lá?
E se existe (aí destaco o “se” porque não provo envolvimento de ninguém) a colaboração, a facilitação por parte dos servidores citados, onde estão os diretores da instituição prisional para inibir tal prática? E na brincadeira do “se”, caso tais gestores soubessem de algum esquema e, porventura também fossem levados a fazer o macaquinho – que nada vê, ouve ou fala-, onde fica a autoridade do secretário de Justiça e Cidadania, que dentre muitas obrigações tem em suas mãos um verdadeiro abacaxi chamado sistema penitenciário potiguar. E o Governo do Estado onde entra nessa engrenagem que a cada dia se mostra menos “azeitada”.
As responsabilidades são múltiplas, bem como as falhas que também são compartilhadas e devem ser sanadas por todos, cada um no seu “quadrado”.
Alcaçuz em números
Setenta e três fugitivos. Quatro secretários. Três diretores. Estes são os números relacionados a Alcaçuz nos últimos oito meses. E trazendo para ponta do lápis, o pior é não se chegar a nenhuma certeza de como e quando algo será feito no Presídio Estadual de Alcaçuz – identificado por inúmeros gestores ao longo dos anos como presídio de segurança máxima-, para que cessem as fugas e se quebre o canal de irrigação do tão alardeado esquema de corrupção que as facilitaria.
Os mais recentes titulares da pasta de Justiça e Cidadania (Thiago Cortez, Aldair da Rocha, Fábio Holanda e Kércio Pinto) apresentam reiteradamente planos de reestruturação, ou pelo menos vontade de transformar o sistema peniteniciário potiguar, o Governo afirma avançar no investimento para construção de novos estabelecimentos prisionais, os agentes penitenciários reclamam das más condições de trabalho e insuficiência do efetivo ( são cerca de 915 profissionais para atender a uma demanda aproximada de 7.215 presos).
Quem paga a conta?
Mas é o povo, o cidadão comum quem mais sofre. Sofre com a insegurança, sofre com a possibilidade de ser vítima da violência urbana, cujo autor pode ter passado “temporada” em algum presídio, os índices de reincidência estão aí para confirmar tal perigo. Mas talvez a pior pressão sofrida por nós seja a dúvida de se algo realmente tem sido feito e mais, no final, quem vai pagar a conta.
A máxima de que “quem está preso quer fugir” já é conhecida de todos nós do lado de cá. E do lado de lá, do lado das autoridades competentes para administrar o sistema, o que tornaria tão dificil se assimilar tal premissa e chegar a uma solução para essa equação? Qualificação profissional? Falta de dinheiro para investir? Má vontade? Corrupção latente? As possibilidades são muitas e, na verdade, até o momento ninguém respondeu satisfatoriamente isso.
A intenção aqui não é puramente direcionar o canhão de luz para este ou aquele gestor, mas mostrar a indignação de um cidadão consciente de que tudo que acontece entre aqueles quatro muros em Nísia Floresta produzem reflexos no cotidiano, para o bem e para o mal.
O apagão ocorrido em Alcaçuz na noite de ontem – intencional ou não, ainda não se foi comprovado – , parece aludir a situação dos que lidam diariamente com o problema, seja encerrado em gabinetes ou no trabalho de campo. A impressão é que não sabem de onde vieram, tampouco para onde vão. E nesse caso não podemos nem brincar dizendo que o último a sair apague a luz porque em época de apagão pode sobrar bandido para todo lado.
Alguém já parou para pensar em privatizar essa vergonha que se chama alcaçuz? Vai todo mundo continuar assistindo sem encontrar culpados ou o verdadeiro motivo para tantas fugas? Será que a Governadora vai decretar calamidade também no sistema prisional do RN?
Se um governo não consegue que um Hospital e um Presídio funcionem direito o que podemos esperar dele?
Alcaçuz é um cabaré de quinta ou não é?
Caro blogueiro, sou agente penitenciário há pelo menos dez
anos e posso afirmar com toda propriedade que o problema do sistema não é
apenas estrutural, ou falta de profissionais qualificados a uma boa gestão
prisional. O problema passa também por questões ligadas a modelo de sistema
existente hoje. O sistema prisional mudou e não acompanhamos tais mudanças. O
sistema prisional moderno e eficaz só pode existir se for tratado como
instituição seria com uma secretaria própria, recursos próprios, regimento interno
reformulado, sobretudo, agentes penitenciários bem qualificados para não acontecer
o que ocorre hoje, onde muitos acham que a qualificação passa apenas por cursos
de defesa pessoal e tiro. Desse modo com tanto despreparo assim é impossível mudar
alguma coisa.